Da Revista Cult
No segundo dia do 3° Congresso Internacional de Jornalismo Cultural, na palestra que teve início às 9h30, o escritor e jornalista cubano Pedro Juan Gutiérrez falou sobre a importância do jogo na escrita: “O mais importante na vida é a brincadeira, o riso, o bom humor. Acho que a arte boa, de qualidade, está em torno da filosofia e do conceito do jogo. É necessário um contraponto vibrante junto com o rigor da seriedade, e esse antagonismo é a arte”, diz.
Na sua opinião, dois escritores que representam bem esta visão são Julio Cortázar e Franz Kafka. “Cada um dos textos de Cortázar expressa um ponto de vista brincalhão a respeito da realidade que, de fato, nunca começa e nunca termina”, diz. Em relação a Kafka, destaca a frase “Quando Gregor Samsa acordou de uma noite de sonhos agitados viu-se transformado num monstruoso inseto”, de A Metamorfose (Companhia das Letras), livro que começou a ler aos 14 anos e só foi terminar 20 anos depois.
“Era a frase mais horrorosa que já tinha sido escrita. Kafka viveu uma vida atormentada mas, apesar de tudo, mostrou um sentido sempre brincalhão e de transmutação da realidade. Ele fez isso porque nunca se levou a sério”, diz. Quando indagado por Xico Sá, mediador da mesa, como conseguiu se livrar da influência direta dos dois escritores citados, Gutiérrez brinca: “Nós amamos os deuses, mas não os imitamos. É melhor que imitemos os demônios”.
Para Gutiérrez, “o trabalho do escritor consiste em viver na rua para depois se trancar sozinho no quarto e brincar, sonhar, refletir e, no final das contas, escrever sobre todas as pessoas que conheceu na rua”. Dentre os artistas de língua portuguesa que escrevem com humor e inclinados aos recursos da brincadeira, cita Jorge Amado, Paulo Lins, Rubens Fonseca, Milton Hatoum e Clarice Lispector.
Em relação a cenas fortes de sexo na literatura, como as presentes em sua Trilogia Suja de Havana(Alfaguara), diz: “Eu fico muito chateado quando vejo alguns escritores que não descrevem o sexo nunca porque têm medo. Acho que existe um sentido muito extenso neles do pecado, da culpabilidade. Isso incomoda, porque nós somos mamíferos. Nós não somos caracóis, não somos bichinhos do mar”.
Sobre o exercício da escrita, Gutiérrez, que está preparando um romance novo há 13 anos a respeito de um cubano que vive em Madri, na Espanha, faz analogia com a arquitetura, profissão que almejava exercer quando jovem. “Quando você escreve um romance, é uma grande construção, como um prédio muito grande. Você precisa saber por onde vai começar, até onde você vai e quais são as sustentações que você precisa ter. O conto já é uma casinha pequena em que você pode cometer um erro sem que ela desabe”, diz, e considera-se mais contista do que romancista.
Além disso, o escritor menciona que “cada escritor, no fundo, embora crie outros personagens, escreve de si mesmo, da própria vida e das pessoas que ele conhece” e que não tem interesse de ver suas obras adaptadas ao cinema.
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