segunda-feira, 31 de maio de 2010

Os jornalistas, os cidadãos, a democracia e a liberdade de imprensa


Por Juliana Rosas, da ASCOM/UEPB

O mês de maio traz efemérides pra dar e vender. Bem, acho que todo dia tem efeméride. Mas vamos lá. Mês de maio é mês das noivas (breguice), das mães (transformado em capitalismo); tem dia do museu, dia da luta antimanicomial, nascimento de Karl Marx... Enfim, a lista seria longa.

O que interessa para nós, profissionais da mídia, e mais ainda, como conseqüência, a toda a população, é que no início do mês, mais precisamente no dia 03, comemora-se o Dia da Liberdade de Imprensa. Coladinho à data, no dia 04, estreou no Brasil um programa que expressa a liberdade da comunicação, o Observatório da Imprensa, programa exibido em TVs públicas e apresentado por um dos mais antigos profissionais do ramo, Alberto Dines. O jornalista e escritor foi o primeiro ombudsman (na época, não assim chamado ou considerado) do país, outra ocupação símbolo de democracia e liberdade de imprensa.

Aí vem a célebre pergunta: temos liberdade de imprensa? No Brasil ou no mundo? O professor do Departamento de Comunicação da UEPB, Rômulo Azevedo, comentou que o ofício de jornalista é, ainda, uma das profissões mais perigosas do mundo. E que em muitos lugares este trabalho (ou o profissional) não é visto com bons olhos. Ele reforçou que em alguns países, como o Brasil, supostamente democráticos, não existe mais censura prévia, mas ainda não há uma plena liberdade de opinião, há uma espécie de censura econômica. Em sua opinião, deveria haver no país uma maior participação do público e que este deveria ser mais atuante e participativo, “menos apenas consumidor”, disse.

Questionado se o Brasil é mais democrático que outros países da América Latina, ele explanou que talvez a Argentina seja um pouco mais. Será? Bem, quiçá o povo argentino é mais politizado que o brasileiro, porém o “pacote regulador da imprensa” lançado pela atual presidente argentina Cristina Kirchner nos faz pensar o contrário. Que, de uma maneira menos explícita que seus colegas latinos, como Hugo Chávez, Evo Morales, Fidel ou Raúl Castro, ela também deseja controlar o que se fala do governo e, quem sabe, deseje uma opinião única. A favor do Estado, claro.

Isso nos faz pensar noutro país do continente americano, mas não latino, os Estados Unidos. O suposto e auto-intitulado país mais democrático do mundo tem dado provas contrárias disso. E isso não é recente. Não foi apenas no pós 11 de setembro. Atitudes reacionárias e antidemocráticas rondam a história dos EUA há bastante tempo. Uma das suposições para o assassinato do presidente Kennedy (pasmem: até hoje não solucionado) atribui-se a atitude democrática e anti-bélica do então presidente. O que, claro, vai de encontro ao sistema altamente beligerante do país, forte ponto no qual sua potência econômica se sustenta. Ou de onde você acha que estes inúmeros países em guerra civil ao redor do mundo compram suas armas?

Mas, voltemos à liberdade de imprensa (como se política, economia e liberdade de imprensa não estivessem conectados... mas vamos lá...). Em 20 de julho de 2009, o famoso jornalista americano Gay Talese, mais especialmente conhecido como um dos expoentes do Novo Jornalismo, esteve no Brasil e participou do famoso (e democrático) programa da TV Cultura Roda Viva.

Discorrendo sobre assuntos midiáticos, uma hora ele falou - sem ser diretamente perguntado – “Então, existe liberdade de imprensa nos Estados Unidos? Sim e não. Sim e não”. E deu exemplos. Vários.
 
A data

O dia 03 de maio foi proclamado Dia Mundial da Liberdade de Imprensa na Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1993, seguindo recomendação adotada na 26ª Sessão da Conferência Geral da UNESCO, realizada em 1991.

Todos os anos, o dia 03 de maio é a data que celebra os princípios fundamentais da liberdade de imprensa, avalia a liberdade de imprensa no mundo, defende a mídia de ataques à sua independência e presta homenagem a jornalistas que perderam suas vidas no exercício de suas profissões.

Há quatro anos atrás, o então secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Kofi Annan, afirmou que “devemos nos conscientizar de que a mídia não pode se limitar a informar sobre as mudanças ocorridas, mas deve ser também, ela própria, um agente de mudança”. Sabemos que, entre políticas, políticos, cabrestos e correligionários tal atitude muitas vezes é difícil de manter, mas lutar contra as agruras do status quo é dever de todo jornalista e cidadão que acredita na democracia.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Professor da UEPB comenta anistia concedida esta semana a Glauber Rocha

 
Perseguido e censurado nos anos da Ditadura Militar (1964-1985), o cineasta Glauber Rocha, pai do Cinema Novo, autor de clássicos do cinema nacional, foi oficialmente anistiado em cerimônia realizada esta semana, no Teatro Vila Velha, em Salvador (BA). Para o coordenador do Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA) da UEPB, Rômulo Azevedo, admirador do legado de Rocha, a decisão foi justa e acertada.

A 37ª Caravana da Anistia, organizada pela Comissão da Anistia do Ministério da Justiça, Ministério da Cultura e Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, decretou o perdão político do Estado 29 anos após a morte do cineasta, em 1981. “Antes tarde, do que nunca”, disse Rômulo, que também domina o fazer artístico da Sétima Arte.

Azevedo acredita que a decisão se configura como uma afirmação da liberdade, para aqueles que, a exemplo de Glauber, foram contra a Ditadura. Ele destacou que Glauber revolucionou a linguagem cinematográfica com um talento ímpar, alcançando grande prestígio internacionalmente, o que atraiu os olhares do mundo todo para o cinema brasileiro. Profundo conhecedor da profícua obra de Glauber, Rômulo acrescentou que seus filmes favoritos, advindos da genialidade do cineasta baiano são Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964) e Terra em Transe (1967). 

Acusado de querer implantar o cinema político como forma de subversão, Glauber foi investigado, vigiado e perseguido pelo regime. “O filme político, através de técnicas minuciosamente estudadas, tem como fim precípuo influenciar a opinião pública, destruindo psicologicamente o espectador. Glauber Rocha e seus seguidores no Brasil querem implantar o cinema político, para com isso enganar o povo e levá-lo à agitação, à desordem política e à revolução”, dizia documento oficial do Ministério da Aeronáutica, datado de 1974.

A filha de Glauber, Paloma Rocha, deu entrada ao processo da anistia em maio de 2006. A vitória da família Rocha no julgamento compreende também o pagamento de indenização: o retroativo de R$ 234 mil, e mais R$ 2 mil de prestação mensal continuada. “Além de ser um ato de anistia, é também uma homenagem a este baiano criativo, ícone da cultura nacional”, declarou a presidente do Grupo Tortura Nunca Mais na Bahia, e uma das três conselheiras responsáveis pelo julgamento do requerimento de anistia, Ana Guedes.


Comissão já anistiou mais de 36 mil

A Comissão de Anistia julgou, até hoje, 55 mil requerimentos de anistia política, segundo dados do Ministério da Justiça. Em 14 mil casos, houve algum tipo de reparação econômica e, em 22,5 mil processos, houve apenas o pedido oficial de desculpas do Estado. O número de pedidos negados é de 18,5 mil e ainda existem 11 mil processos aguardando definição em primeira instância, e mais 3.5 mil com solicitação de recurso. No total, o Governo já concedeu R$ 2,4 bilhões em reparações econômicas.

Antes de Glauber, o Ministério da Justiça já havia concedido anistia a outras personalidades do meio artístico, a exemplo dos escritores e cartunistas Ziraldo e Jaguar, em 2008; e, em abril deste ano, ao dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, contemplado com uma pensão vitalícia de R$5 mil e mais R$569 mil retroativos.

De acordo com a Lei, são anistiáveis, com reparação financeira, as pessoas que sofreram perseguição no período de 18 de setembro de 1946 a 05 de outubro de 1988. As reparações por causa de violações a direitos humanos podem ser requeridas a qualquer tempo.

Mais sobre Rômulo Azevedo


Rômulo Azevedo trabalha com o fazer cinematográfico há mais de 30 anos. Sua trajetória artística conta com mais de 20 filmes, entre documentários e ficção, sendo muitos deles premiados em festivais. A última produção de Rômulo, intitulada Biu do Violão e o Diamante Cor de Rosa (2010), foi muito bem recebida pela crítica.
 
Formado em Direito, com especialização em Comunicação, o professor é um dos fundadores do Movimento Cineclubista em Campina Grande, pioneiro do telejornalismo paraibano e, há décadas, vem formando profissionais que atuam na imprensa paraibana.
 
Ano passado, ele completou 25 anos de carreira na televisão, mas é ao cinema que  atribui os rumos que sua vida seguiram.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Casa Brasil da Prefeitura Municipal de Campina Grande promoverá IV Sarau Poético hoje (27)


A Casa Brasil da Prefeitura Municipal de Campina Grande promoverá hoje (27) em seu auditório, a partir das 17h, o IV Sarau Poético. A programação do evento este ano também prevê a realização de uma exposição de quadros e uma apresentação da banda “Os Elementais”, que fará a abertura e também o encerramento do Sarau. A entrada é franca.

A quarta edição do Sarau Poético já confirma o evento como um referencial cultural consolidado, estimulando e promovendo a divulgação e difusão dos saberes no município. Os organizadores explicam que o Sarau Poético é um trabalho de fomento e agregação gradativa das expressões culturais populares que vem ano após ano resultando na participação de artistas como Sebastião Marques, Benedito do Rojão e representantes da Casa do Poeta.

Durante o Sarau Poético também acontecerá, no Hall de entrada da Casa Brasil, uma exposição de pinturas do artista plástico José Alexandre Pereira e o show de lançamento do grupo “Os Elementais”. A banda surgiu da organização de um voluntário da Casa Brasil, o professor de violão, músico e compositor Ikky e seus alunos do curso de violão.

A Casa Brasil está localizada à Rua Advogado Otávio Amorim, s/n, bairro do Cruzeiro, ao lado do antigo Forrock.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Música de professor da UEPB é sucesso na voz do cantor paraibano Capilé


Por Oziella Inocêncio, da ASCOM/UEPB

A música Xote do Novo Amor, de autoria do professor da UEPB, Antônio Guedes Rangel Junior, é um dos destaques do mais novo CD promocional do cantor paraibano Capilé. Intitulado "O Melhor Forró do Mundo", o compacto traz 24 faixas.  Rangel trabalha com música há mais de trinta anos, dividindo seu talento para a criação artística com as atividades que desenvolve na Instituição, onde ocupa também o cargo de pró-reitor de Planejamento.

Como disse, certa feita, o gênio Leonardo da Vinci (1452-1495), a simplicidade é o último grau de sofisticação. E foi justamente pela simplicidade que a letra de Xote do Novo Amor atraiu Capilé. "Escutei Junior cantar uma vez, durante um show do Projeto Autoral, no Bar e Restaurante Picanha 200, e achei linda demais, muito sonora", explicou o cantor. Esta é a primeira parceria realizada entre os artistas, mas outras deverão surgir ainda este ano, segundo planeja Capilé. Ele lançará um CD e um DVD no próximo semestre em celebração a suas duas décadas de trajetória musical e quer incluir outra criação de Rangel Junior no CD.

Capilé destacou que aquilo que mais apreciou em Xote do Novo Amor foi a poética da letra e também seu teor romântico. Ele aposta na nova música para embalar os corações apaixonados durante as festividades do Maior São João do Mundo. "A música já está fazendo bastante sucesso, sendo alvo de muitas solicitações dos fãs para tocá-la quando das minhas apresentações", disse. E, por falar em São João, a agenda do artista já está lotada nos meses de junho e julho.

Para Rangel Junior, que já teve músicas cantadas por Santana, Tom Oliveira e Sandra Belê, entre outros, configura-se como uma grande realização ver suas criações sendo interpretadas por artistas reconhecidos pela qualidade e profissionalismo. Afastado dos palcos, devido às inúmeras atividades que desempenha na UEPB, ele diz que a carreira de compositor lhe concede a oportunidade de estar presente nos espetáculos, mesmo na ausência. Rangel aprovou sobremodo Xote do Novo Amor na voz de Capilé. "Ele foi muito fiel a música, não deixando de dar aquele toque pessoal. É sempre especial ter seu trabalho admirado por alguém. Ainda mais quando se é escolhido por um intérprete de talento. É uma alegria", relatou satisfeito.

Rangel acrescentou que a realização efetiva da obra de arte acontece quando o trabalho do artista é reconhecido. O ápice aconteceria no momento em que o público aprende, compreende e canta a letra. "Meu anseio é despertar a sensibilidade das pessoas e que as minhas ideias possam circular de modo a emocioná-las", explicou. Ele explanou que suas composições buscam traduzir sentimentos universais. "Conto estórias minhas, de amigos meus, mas que também se confundem com aquilo que eu sinto, com as minhas impressões a respeito do mundo", salientou.

No próximo dia 03 de junho, no período noturno, Rangel fará uma apresentação ao vivo na praça localizada embaixo do Viaduto Elpídio de Almeida, em Campina Grande. Na oportunidade, os integrantes do Projeto Autoral gravarão um CD.

Mais sobre Rangel Junior

Paraibano de Juazeirinho, Rangel cresceu num ambiente a que se pode chamar de culturalmente rico. Desde criança, escutava o pai cantando samba e o avô declamando literatura de cordel e promovendo saraus em sua casa. Suas influências musicais são ecléticas, percorrendo habilmente desde o forró, xote, chorinho e galope, até o samba, bossa nova, bolero, valsa e coco.

 "Não somente a música, mas a arte como um todo, faz parte da minha vida desde a infância. Apanhava da minha mãe para parar de ler, porque deixava queimar a comida nas panelas. Vivia entretido nas minhas leituras. Naquela época, só havia homens em casa e também cuidávamos da cozinha", recordou.

E foi assim, à custa da degradação dos utensílios domésticos, da contemplação e do exercício do fazer da Arte que seu talento floresceu e o consolidou como um criador renomado no contexto artístico da contemporaneidade.

Mais sobre o Projeto Autoral

O Projeto Autoral, apoiado pelo Restaurante Picanha 200, na figura de Abdon Napy Charara Neto, é motivado pelo surgimento de novos autores e compositores que, com eficientes atuações, têm colocado em destaque a música paraibana. Deste modo, o movimento musical vem conquistando cada vez mais espaço cultural na Paraíba e no Nordeste do Brasil.

O Projeto envolve inúmeros artistas, a exemplo do Presidente da Associação Paraibana de Autores e Compositores e produtor musical do Projeto Autoral, Alquimides Daera, Tina Dias, Fidélia Cassandra, Gabriel Caminha, Júnior Cordeiro, Junior Meneses, Mano Marques, Gercino Agra e Roberto Araújo, entre outros.

Confira, abaixo, a letra de Xote do Novo Amor:


SE VOCÊ PENSA QUE EU VOU FICAR
MARCANDO PASSO PELA VIDA, AMOR,
TÁ ENGANADA, A VIDA
AGORA É COMO EU SEMPRE QUIS

SE VOCÊ PENSA QUE EU VOU FICAR
CHORANDO O LEITE DERRAMADO, AMOR
ERROU DE NOVO, AMOR,
AGORA EU CANTO E SOU FELIZ

QUEM VACILOU FUI EU
QUE ACREDITEI EM SEU CARINHO
FUI ENGANADO, SEI,
MAS RESOLVI FICAR SOZINHO.

O MUNDO É GRANDE E DEUS
ESCREVE CERTO EM LINHA TORTA
QUEM SABE ANDANDO POR AÍ
A QUALQUER HORA VEM BATER
UM AMOR NOVO EM MINHA PORTA.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Tenho Medo...


Por Rubem Alves ( Educador, escritor e psicanalista)

Um casal de amigos enviou-me um fax com um pedido: que lhes mandasse os nomes dos livros que tenho sobre o medo. Explicaram a razão do pedido: tinham medo... E pensavam que pela leitura daquilo que sobre o medo se escreveu como ciência e filosofia, o seu próprio medo ficaria mais leve.

Procurei fazer o que me pediam. Pus a funcionar os arquivos da minha memória, procurando identificar os livros sobre o medo que estariam na minha biblioteca. Inutilmente. Nenhum título me veio à mente. Dei-me conta de que não possuo nenhum livro sobre o medo. Sem livros a que recorrer, pus-me a pensar meus próprios pensamentos sobre o medo. E o primeiro pensamento que me veio foi o seguinte: Eu tenho medo. Eu sempre tive medo. Viver é lutar diariamente com o medo. Talvez esse seja o sentido a lenda de São Jorge, lutando com o dragão. O dragão não morre nunca. E a batalha se repete, a cada dia.

Como não pudesse ajudar meus amigos com bibliografia filosófica e científica, resolvi compartilhar com eles minha condição. O medo tem muitas faces. Lembro-me de que, bem pequeno ainda, acordei chorando, imaginando que um dia eu estaria sozinho no mundo. Foi uma dura experiência de abandono. Tive medo de não ser capaz de ganhar a minha vida quando meu pai e minha mãe partissem. Na verdade eu tinha era medo da orfandade, do abandono. Minha filha Raquel tinha não mais que três anos. Era cedo, bem cedo. Ela me acordou e me perguntou: “Papai, quando você morrer você vai sentir saudades?“ Essa foi a forma delicada que ela teve de me dizer que tinha medo da saudade que ela iria sentir, quando eu partisse. O rosto do medo mudou. Mas o sentimento continua o mesmo. Tenho medo da solidão. Há uma solidão boa. É a solidão necessária para ouvir música, ler, pensar, escrever. Mas há a solidão do abandono. Buber relata que, numa língua africana, a palavra para dizer “solidão“ é composta de uma série de palavras aglutinadas que, se traduzidas uma a uma, dariam a frase: Lá, onde alguém grita: Oh! mãe! Estou perdido! O trágico dessa palavra é que o grito nunca será ouvido, nunca terá resposta. Tenho medo da degeneração estética da velhice. Tenho medo que um derrame me paralise, deixando-me sem meios de efetivar a decisão que seria sábia e amorosa: partir. Tenho medo da morte. Antigamente esse medo me atormentava diariamente. Depois ele se tornou gentil. Ficou suave. Passei a compreender que a morte pode ser uma amiga. Veio-me à mente uma frase que se encontra na oração Pelos que vão morrer, de Walter Rauschenbusch: “Ó Deus, nós te louvamos porque para nós a morte não é mais uma inimiga, e sim um grande anjo teu, nosso amigo, o único a poder abrir, para alguns de nós, a prisão da dor e do sofrimento e nos levar para os espaços imensos de uma nova vida. Mas nós somos como crianças, com medo do escuro...“ (Orações por um mundo melhor, Paulus ). O Vinícius disse a mesma coisa de um outro jeito: “Resta esse diálogo cotidiano com a morte, esse fascínio pelo momento a vir, quando, emocionada, ela virá me abrir a porta como uma velha amante, sem saber que é a minha mais nova namorada.“ Boas são as palavras das orações e dos poemas: elas têm o poder de transfigurar a face do medo. Meu medo da morte ficou suave porque o seu terror foi amenizado pela tristeza. Ah! Mário Quintana! Como eu gosto de você, velho que nunca deixou de ser menino! Você sabia tirar o terror do medo rindo diante dele. Você lidava com seus medos como se fossem brinquedos. Delicioso, esse brinquedinho: “Um dia...pronto!...me acabo./ Pois seja o que tem de ser./ Morrer: que me importa? O diabo é deixar de viver!“ Isso mesmo. O terrível não é morrer; é deixar de viver. O terrível não é o que está à frente; é o que deixamos para trás. É um desaforo ter de deixar essa vida! Zorba, quando percebeu que seu momento chegara, foi até a janela, olhou para as montanhas no horizonte, pôs-se a relinchar como um cavalo e gritou: “Um homem como eu teria de viver mil anos!“ E eu pergunto: “Por que tanta modéstia? Por que só mil?“

Mas tenho medo do morrer. Medo da morte e medo do morrer são coisas distintas. O morrer pode ser doloroso, longo, humilhante. Especialmente quando os médicos não permitem que o corpo que deseja morrer, morra.

Tenho medo também da loucura. Não há sinal algum de que eu vá ficar louco. Mas nunca se sabe! Muitas mentes luminosas ficaram insanas. E tenho medo de que algo ruim venha a acontecer com meus filhos e netas. Sábias foram as palavras daquele homem que, no livro onde deveriam ser escritos os bons desejos à recém-nascida neta do rei, escreveu: “Morre o avô, morre o pai, morre o filho...“ Enfurecido, o rei lhe pede explicações. “Majestade: haverá tristeza maior para um avô que ver o seu filho morrer? E para o seu filho: haveria tristeza maior que ver sua filhinha morrer? É preciso que a morte aconteça na ordem certa...“ Tenho medo de que a morte não aconteça na ordem certa.

Somos iguais aos animais, em que as mesmas coisas terríveis podem acontecer a eles e a nós. Mas somos diferentes deles porque eles só sofrem como se deve sofrer, isto é, quando o terrível acontece. E nós, tolos, sofremos sem que ele tenha acontecido. Sofremos imaginando o terrível. O medo é a presença do terrível-não-acontecido, se apossando das nossas vidas. Ele pode acontecer? Pode. Mas ainda não aconteceu e nem se sabe se acontecerá.

Curioso: nós, humanos, somos os únicos animais a ter prazer no medo. A colina suave não seduz o alpinista. Ele quer o perigo dos abismos, o calafrio das neves, a sensação de solidão. A terra firme, tão segura, tão sem medo, tão monótona! Mas é o mar sem fim que nos chama: “A solidez da terra, monótona, parece-nos fraca ilusão. Queremos a ilusão do grande mar, multiplicada em suas malhas de perigo...“ (Cecília Meireles).

A pomba, que por medo do gavião, se recusasse a sair do ninho, já se teria perdido no próprio ato de fugir do gavião. Porque o medo lhe teria roubado aquilo que de mais precioso existe num pássaro: o vôo. Quem, por medo do terrível, prefere o caminho prudente de fugir do risco, já nesse ato estará morto. Porque o medo lhe terá roubado aquilo que de mais precioso existe na vida humana: a capacidade de se arriscar para viver o que se ama.

O medo não é uma perturbação psicológica. Ele é parte da nossa própria alma. O que é decisivo é se o medo nos faz rastejar ou se ele nos faz voar. Quem, por causa do medo, se encolhe e rasteja, vive a morte na própria vida. Quem, a despeito do medo, toma o risco e voa, triunfa sobre a morte. Morrerá, quando a morte vier. Mas só quando ela vier. Esse é o sentido das palavras de Jesus: “Aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á. Mas quem perder a sua vida, a encontrará.“ Viver a vida, aceitando o risco da morte: isso tem o nome de coragem. Coragem não é ausência do medo. É viver, a despeito do medo.

Houve um tempo em que eu invocava os deuses para me proteger do medo. Eu repetia os poemas sagrados para exorcizar o medo: “Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum...“ “Mil cairão à tua direita, dez mil à tua esquerda, mas nenhum mal te sucederá...“ A vida me ensinou que esses consolos não são verdadeiros. Os deuses não nos protegem do medo. Eles nos convidam à coragem de viver a despeito dele.


Aperitivos

1. Talvez essa seja a razão por que amamos o circo: porque nele podemos sentir medo sem correr perigo: voamos com os trapezistas, equilibramo-nos no fio de aço, enfrentamos tigres e leões... Experimentamos, na fantasia, o medo diante do terrível, assentados num lugar seguro...

2. Bachelard: a delicadeza das suas meditações sobre a luz da vela acontece perante o medo de que um vento mais forte apague a chama: “Sim, a luz de um olhar, para onde ela vai quando a morte coloca seu dedo frio sobre os olhos de um morto?“ E no último parágrafo ele pergunta: “... será que ainda há tempo...?“

3. Drummond: “Eterno (mas até quando?) é esse barulho em nós de um mar profundo. Naufragamos sem praia; e na solidão dos botos afundamos...“ E o Vinícius, que confessava o “terrível medo de renascer dentro da treva.“ (Correio Popular, Caderno C, 22/07/2001.)

segunda-feira, 24 de maio de 2010

O Sexo Frágil




Por Drauzio Varella

Fico admirado com a onipotência masculina.
Quando pequenos nos ensinaram que homem não chora, que Deus nos criou corajosos com a finalidade de protegermos as mulheres, coitadas, seres frágeis prestes a esvair-se em lágrimas à menor comoção. Como sobreviveriam elas não fosse a nossa existência?
Por acreditar cegamente nesses ensinamentos, assumimos o papel de legítimos representantes do sexo forte, mesmo que as evidências nos desmintam desde a mais tenra infância.
Não é exagero, leitor. As meninas começam a falar muito antes. Aos dois anos já constroem sentenças com sujeito, verbo e predicado, enquanto nessa idade mal conseguimos balbuciar meia dúzia de palavras que só a mamãe compreende.
Você dirá que somos mais ágeis e mais orientados espacialmente. E daí? Qual a vantagem de virar cambalhota e plantar bananeira?
O desenvolvimento intelectual delas é tão mais precoce que alguns neuropediatras consideram injusto colocar meninos e meninas de sete anos na mesma sala de aula: deveríamos ficar um ano para trás.
Na puberdade, elas viram mocinhas de formas e gestos graciosos. Nós nos transformamos em quimeras desengonçadas, metade criança, metade homem com penugem no bigode, espinhas em vez de barba, voz em falsete e loucura por futebol.
Não é a toa que as adolescentes suspiram pelos rapazes mais velhos e nem se dignam a olhar para nossa cara quando nos derretemos diante delas.
No casamento, somos feitos de gato e sapato. Podemos estar cobertos de razão, gritar, espernear e esbravejar -no fim a vontade delas prevalecerá. É guerra perdida. São donas de uma arma irresistível: a tenacidade para repetir cem vezes a mesma ladainha. Com o passar dos anos, aprendemos a fazer logo o que elas querem; sai mais em conta. Nós nos cansamos e desistimos de reivindicar um direito, elas jamais.
Faça um teste. Combine com um amigo um jantar com as mulheres sem falar com elas. A chance de dar certo é zero. Agora inverta, as duas mulheres marcam uma noite para o tal jantar sem avisá-los. Você chega em casa louco para vestir o bermudão e ver seu time na TV. Qual a probabilidade de a televisão passar a noite desligada?
Você dirá que pelo menos somos mais saudáveis, enquanto elas vivem cheias de achaques. De fato, nas mulheres a cabeça dói, o útero incomoda e o intestino não funciona, mas as desvantagens acabam aí.
Durante o desenvolvimento embrionário, para construirmos ossos mais robustos e músculos mais potentes, desviamos parte da energia que seria utilizada para fortalecer o sistema imunológico. Por essa razão, em todas as sociedades o homem está mais sujeito a processos infecciosos graves.
No Brasil, arcamos com mais de 60% da mortalidade geral. A cada três pessoas que perdem a vida, duas são do sexo masculino.
Os ataques cardíacos vêm em primeiro lugar. Começamos a correr risco a partir dos 45 anos; as mulheres, só ao atingir a menopausa. Depois vêm os derrames cerebrais, seguidos pelos homicídios. Essa distribuição se repete em todas as regiões do país.
Fumamos e bebemos muito mais. Perto de 90% dos óbitos por acidentes de trânsito, quedas e afogamentos causados pelo abuso de álcool ocorrem entre nós.
Somos mais sedentários e desleixados com a saúde. Tratamos o corpo a pontapé e fugimos dos exames preventivos como o diabo da cruz. Ir ao médico? Só quando chegarmos às últimas ou se for para ficarmos livres da insistência das mulheres que nos cercam.
Em condições sociais comparáveis, mulheres vivem mais do que homens em todos os países do mundo. No Brasil, nossas vidas duram, em média, 7,6 anos menos. A longevidade feminina é visível: compare o número de viúvas com o de viúvos que você conhece.
Ao perder a companheira, o homem de idade fica desamparado. Se não casar imediatamente e não tiver filhas ou irmãs por perto, estará perdido, é incapaz de pregar um botão ou de fritar um ovo. Na situação contrária, a mulher poderá sofrer, sentir falta, mas cuidará da rotina doméstica sem dificuldade.
Morreremos mais cedo e deixaremos nossas economias. Livres da repressão machista e do trabalho que lhes dávamos, elas terão 7,6 anos para fazer excursões turísticas e lotar vans para ir a shoppings e teatros, animadas e conversadeiras. Para muitas, não será fácil esconder o ar de felicidade plena.

 

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Dia sem mexicanos nos EUA: protesto contra a lei anti-imigração

Do Portal Vermelho

Comerciantes da cidade de Nuevo Laredo, na fronteira do México com os Estados Unidos, divulgaram esta semana o programa "Um dia sem mexicanos nos EUA", protesto marcado para esta segunda-feira  (24) contra a questionada lei contra os imigrantes no estado do Arizona.
 
O líder da Câmara Nacional de Comércio (Canaco) de Nuevo Laredo, Emilio Girón, disse que o objetivo do programa é fazer com que os residentes mexicanos da região não visitem o país vizinho. "Queremos que as autoridades americanas vejam que estamos unidos e que eles precisam de nós, tanto como força de trabalho como consumidores", disse Girón.

No último passado 27 de abril a governadora do Arizona, Jan Brewer, aprovou a Lei SB1070, que entra em vigor no final de julho. A norma faz dos imigrantes ilegais criminosos e permite que a polícia detenha sem ordem judicial qualquer pessoa, por conta de sua aparência ou por suspeita de que seja um imigrante.

Durante "o dia sem mexicanos", os comerciantes entregaram panfletos nas imediações da Ponte Internacional Número Uno, que liga Nuevo Laredo a Laredo, no estado americano do Texas.

Girón explicou que a ideia é criar consciência entre a comunidade fronteiriça sobre a necessidade de demonstrar a unidade do povo mexicano contra das leis migratórias dos EUA.

O dirigente destacou que o convite para participação no projeto continuará durante este fim de semana, e a iniciativa começará a ser colocada em prática na segunda-feira pela manhã.

O presidente do México, Felipe Calderón, defendeu no Congresso norte-americano os imigrantes e pediu aos EUA que encarem desafios como a imigração ilegal, o tráfico de drogas e a integração da América do Norte. O presidente condenou novamente a lei no Arizona que, segundo ele, introduz a "terrível ideia de discriminação racial".

Para ele, a imigração ilegal do México para os EUA não é positiva. "Nossas comunidades perdem o melhor de sua gente: a mais trabalhadora, a mais dinâmica, seus líderes", explicou. Além disso, Calderón assegurou que reconhece o direito de qualquer país de fazer cumprir suas leis, mas lembrou que o necessário é "regular um sistema que não funciona".

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Não Mate a Paraíba de Vergonha


Por Noaldo Ribeiro, renomado ativista cultural de Campina Grande

Durante a semana passada estive na capital. Fiquei impressionado com a beleza das obras de arte que estão sendo postas em pontos estratégicos da cidade, a exemplo da que foi encravada nas margens da Lagoa, fato que enriquece ainda mais aquele cartão-postal da cidade.

Fui tomado por um sentimento de euforia e inveja. Euforia por constatar que na velha Filipéia está sendo construída uma paisagem urbana vanguardeira, tendendo a tornar-se em breve num belo museu a céu a aberto. Inveja por, sendo de Campina Grande, vê na mesma a crescente degradação do patrimônio histórico e artístico, além da completa ausência de políticas públicas nessa a área.

A inveja continua, mas o sentimento de euforia logo se foi, também, quando ao ler em blogs locais as queixas de uma senhora, cujo nome não gravei, sobre essas ações inusitadas levadas a cabo pela prefeitura de João Pessoa.

Essa inacreditável criatura, inacreditavelmente portadora de um mandato conferido pela população (vim a saber posteriormente) alega que as esculturas não se afinam com o sentimento religioso dos pessoenses.

Mesmo retardado, deduzir em questão de segundos que se tratava de uma fanática religiosa, seja evangélica ou carola de sacristia, sem, no entanto descartar a hipótese (parece mais plausível) de que se vendo incompetente para abrir um debate político, vale-se da exploração das superstições alheias para tirar proveito da conjuntura eleitoral que se avizinha – atitude a meu ver compatível com o atraso dos tempos medievais.

Mesmo não conhecendo a vereadora, nem por nome ou fotografia, imagino-a como uma senhora de idade média.

Mais surpreso, ainda, fiquei ao verificar que alguns jornalistas (teoricamente formadores de opinião) seguem – talvez por motivo igual – a posição desvairada da edil.

Diante desse quadro só me resta fazer um apelo desesperado: não mate a Paraíba de vergonha. Se isto chegar aos ouvidos da mídia nacional na certa seremos ridicularizados. Se assim acontecer, tomara que não, serei obrigado a aplaudir as críticas e chacotas dos sulistas.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Existe algum problema em ser gay?


Por Beth Torres (jornalista, formada pela UFPB, a profissional já trabalhou em diversos periódicos do Estado)
Tinha feito uma promessa que não rebateria atos praticados por pessoas que não tem o que dizer, mas não consegui ficar calada diante de mais uma aberração disseminada pelo ex-deputado federal Walter Brito Neto (PRB). Ele, através da sua assessoria e do twitter, enviou matéria e comentários parabenizando o presidente da República em exercício, José Alencar, por não ter assinado o decreto que cria o ‘Dia Nacional Contra a Homofobia’.

O ex-parlamentar - que foi cassado (perdeu o mandato que não conquistou através do voto) por praticar infidelidade partidária – comemorou a não assinatura do decreto, simplesmente, porque é um homofóbico. Ele disse ainda que enviará uma carta de protesto contra a assinatura do decreto, que ficou para a próxima semana, ao presidente Lula (PT).

O melhor de toda essa história é a justificativa dada por Walter Brito Neto sobre o porquê de não ser necessária a “invenção” deste dia. “A impunidade e a criminalidade atingem a todos os brasileiros. Além disso, os homossexuais são bem menos assassinados do que a população geral. Nos últimos 25 anos mais de 800 mil brasileiros foram assassinados. Desse número, quantos eram gays? Se fossem 10%, o número de homossexuais assassinados seria 80 mil. Se fosse apenas 1%, 8 mil assassinatos homossexuais estariam registrados. Entretanto, nos últimos 25 anos, de acordo com informação do próprio Grupo Gay da Bahia, apenas 2.511 homossexuais foram assassinados”.

E a justificativa, que é uma pérola, não para por aí. O ex-parlamentar continua: “Ademais, os homossexuais, muitas vezes, se expõem nas noites promíscuas e ficam sujeitos, tanto quantos aqueles que se dão as práticas libertinas, a sofrerem violências de todos os tipos; ou seja, desse número bem pequeno de homossexuais assassinados, muitos estavam em zonas criminais, a altas horas da madrugada, em ambientes de drogas e prostituição. Sem mencionar o fator do crime passional, onde o assassino é muitas vezes amante da vítima, tão homossexual quanto ela”.

Walter ainda argumenta que a juventude pode ser facilmente influenciada pelos movimentos gays. “O movimento pró-homossexualismo pode ser tão devastador e igualmente agressivo, castrando nosso direito fundamental de se posicionar livremente sobre quaisquer assuntos e educarmos nossos filhos da maneira que nos aprouver, conferindo dignidade e respeito”.

Desculpem compartilhar essas atrocidades com vocês, mas não pude guardá-las só para mim. Não sei se isso foi uma estratégia para conseguir espaço na mídia, pois quem não tem o que dizer, não é liderança política e não tem serviço prestado, costuma dizer absurdos para virar notícia, mas o problema é que ele abordou um assunto sério e delicado e, por isso, precisa ser rebatido.

Nunca imaginei que da cabeça de uma única pessoa poderia sair tantas besteiras, tanto preconceito e tanta falta do que dizer. Ex-deputado, pelo que notei, o senhor acha normal que uma pessoa seja morta porque tem uma opção sexual diferente daquela que o senhor acha normal. Para mim o senhor é tão criminoso quanto aqueles que matam homossexuais, pois se utiliza do espaço que tem para disseminar preconceitos.

Não estou dizendo aqui que todos devem concordar ou defender o homossexualismo, mas acredito que se deve ter respeito aos seres humanos e a suas decisões. Quanto ao Dia Nacional Contra a Homofobia, acho que precisamos sim de um marco para lembrar e combater o absurdo que é discriminar, agredir ou matar alguém por se relacionar com pessoas do mesmo sexo. Esse dia, ex-deputado, também servirá para combater pessoas como o senhor que tem um pensamento pequeno e atrasado.

Acho que o senhor não tem conhecimento que na Alemanha nazistas homossexuais foram mortos pelo simples fatos de serem homossexuais. Pelo que vejo o senhor concorda e defende as práticas de Adolf Hitler. Isso me assusta! O triângulo rosa (símbolo gay), ex-parlamentar, foi usado nos campos de concentração nazistas para indicar quais homens haviam sido capturados por práticas homossexuais.

A minha alegria seria que uma pessoa como Walter Brito Neto não conseguisse se eleger no pleito de outubro próximo. A Paraíba não merece ter como representante alguém que pensa tão pequeno e que ainda se ocupa em disseminar preconceitos. Ninguém tem o direito de achar normal matar uma pessoa por ser homossexual. Eu defendo, sem medo de sofrer represálias, que pessoas como o ex-deputado federal sejam abolidas da vida pública.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Coletânea resgata lado poeta de Machado de Assis


Por Marco Rodrigo Almeida, da Folha de São Paulo  

Mesmo quem não é especialista em literatura conhece frases como "Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis" ou "Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria", ambas de "Memórias Póstumas de Brás Cubas".

Muito mais difícil é achar quem saiba um verso do mais importante escritor brasileiro. Também no meio acadêmico a pesquisadora Rutzkaya Queiroz dos Reis constatou essa situação quando começou a estudar as poesias de Machado de Assis (1839-1908) em 1999.

Tal "estranheza" motivou sua tese de mestrado e ganha as páginas de livro com o lançamento de "A Poesia Completa". O livro traz 214 poemas, entre obras originais e traduções feitas por ele, além da recepção dos críticos da época.

Há ainda uma paródia da "Divina Comédia", de Dante, atribuída a Machado e publicada só agora em livro. Recuperada em 2008 pelo pesquisador Eugêncio Vinci de Moraes, a poesia foi escrita em 1874 na revista "Semana Ilustrada".

Outra preocupação da pesquisadora foi corrigir os inúmeros erros dos quais a produção poética de Machado foi vítima em edições anteriores. Segundo ela, é comum encontrar poemas com versos suprimidos e palavras trocadas. Apesar de relegada a um segundo plano na obra de seu autor, o "lado poeta" foi constante na carreira de Machado. Em 1854, aos 15 anos e muito antes de escrever os primeiros romances, publicou um soneto no "Periódico dos Pobres".

Dez anos e muitos versos depois, surge o primeiro livro de poemas, "Crisálidas". Os elogios, se não foram unânimes, foram os melhores que o Machado poeta recebeu em vida: havia ali, segundo um crítico da época, "robustas esperanças da poesia nacional".

Os seguintes, "Falenas" (1870) e "Americanas" (1875), porém, não corresponderam às expectativas. Eram tidos como de estilo "tardio e inadequado". Os elogios só voltariam em maior número no último volume poético de Machado, "Poesias Completas" (1901), que, aos livros anteriores, acrescentava as obras de "Ocidentais", hoje tidas como suas melhores.

Mesmo assim, com sérias restrições. Em texto da época, Múcio Teixeira disse que Machado encheu 376 páginas de versos "sem poesia" e de "uma monotonia soporífera". "Pelos parâmetros da crítica", avalia Reis, "Machado, de um modo geral, ficou com a imagem de ser, além de mau poeta, um poeta conservador". Antonio Carlos Secchin, poeta e membro da Academia Brasileira de Letras, diz que o Machado poeta foi eclipsado pelo "peso arrasador" do prosador.

"Ele tem apuro técnico, faz uma poesia mediana. Acontece que os poemas são sempre medidos pelos romances e, aí, a comparação é imensamente desfavorável aos poemas." Valentim Facioli, professor da USP e dono da editora Nankin, é um dos raros defensores dos versos machadianos.

"Machado não embarcava nos valores nacionalistas ou paisagistas. Como nos romances, era mais um poeta do pensamento do que da emoção. Por isso não foi compreendido". Acrescenta ainda que a poesia machadiana é rica em formas, rimas e metáforas. "No século 19, apenas Gonçalves Dias e Cruz de Souza foram maiores que ele na poesia brasileira".

A POESIA COMPLETA
Autor: Machado de Assis
Organização: Rutzkaya Queiroz dos Reis
Editora: Nankin/Edusp
Quanto: R$ 100 (752 págs.)

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Festival Cinema com Farinha abre inscrições


Para os cineastas e cinéfilos de plantão, uma boa notícia. Foi divulgada a abertura das inscrições do 4º Festival Cinema com Farinha - Festival Audiovisual do Sertão Paraibano. As inscrições vão até 20 de junho e o evento ocorrerá entre os dias 19 e 22 de agosto, na cidade de Patos, sertão da Paraíba.

O 4º Festival Cinema com Farinha – Festival Audiovisual do Sertão Paraibano é um evento que visa a proporcionar um espaço de encontro para discussão e exibição da produção audiovisual regional e nacional, e ainda, atender à demanda existente para esse tipo de manifestação cultural no sertão paraibano.

Almeja, além disso, dar visibilidade a cena cultural "oculta" da região, detectando produções audiovisuais no sertão paraibano, contribuindo não somente para a divulgação imediata, mas para a formação de um banco de memória acessível.

Estão disponíveis no site Festival o regulamento e a ficha de inscrição para participar do evento. Confira: http://www.cinemacomfarinha.com

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Campina Grande recebe Mostra de Teatro do Oprimido da Paraíba e Rio Grande do Norte

 
Campina Grande será palco da “Mostra de Teatro do Oprimido da Paraíba e Rio Grande do Norte”, que será realizado hoje e amanhã (14 e 15 de maio), no Cine Teatro do Sesc-Centro. Na ocasião, multiplicadores e praticantes do método criado pelo teatrólogo e ensaísta Augusto Boal se reunirão para atividades estéticas e teatrais, seminário de saberes e práticas e o lançamento do livro póstumo de Boal. O evento é gratuito e aberto a todos os públicos.

Nesta sexta, 14 de maio, a partir das 19h, o público irá assistir a duas peças teatrais com atuação de grupos de Cuité/PB e de Poço Branco/RN. Ao final de cada apresentação, alguns dos espectadores serão convidados a entrar na cena, trocando de lugar com o protagonista, para mostrar alternativas aos problemas encenados. Nas peças os atores encenam episódios reais de suas vidas. Neste dia acontece também: uma exposição de produtos artísticos produzidos pelos grupos locais; a Sessão Solene Simbólica de Teatro Legislativo; o lançamento do livro póstumo do teatrólogo e ensaísta Augusto Boal, “A Estética do Oprimido”, considerado o testamento artístico do autor, que pouco antes de falecer foi nomeado embaixador mundial do teatro pela Unesco.

Na sessão de Teatro Legislativo, a plateia, além de fazer as intervenções substituindo o personagem oprimido, pode também sugerir propostas de Lei ou de ações concretas que tragam alternativas ao problema. Com o apoio de um assessor legislativo e um especialista no tema, serão selecionadas duas propostas para serem debatidas e votadas. As aprovadas serão encaminhadas ao Poder Legislativo ou às autoridades competentes. Através do Teatro Legislativo foram criadas 13 Leis Municipais na cidade do Rio de Janeiro, duas Leis Estaduais nesse estado e tramitam no Congresso Nacional dois Projetos de Lei.

As atividades realizadas em Campina Grande integram o Projeto Teatro do Oprimido de Ponto a Ponto, cujo objetivo é a capacitação e o acompanhamento de novos multiplicadores do método em dezoito estados brasileiros e quatro países da África lusófona: Moçambique, Guiné-Bissau, Senegal e Angola.

O evento é uma realização do Centro de Teatro do Oprimido (CTO), com apoio do SESC Paraíba e patrocínio do Ministério da Cultura (Minc), por intermédio do Programa Cultura Viva. Os cursos de formação do projeto em Campina Grande aconteceram em parceira com o Centro Universitário de Cultura e Arte – CUCA, que realizou articulação com o CTO.

Mais sobre o Teatro do Oprimido

Surgido em 1986, o Centro de Teatro do Oprimido (www.cto.org.br) é um centro de pesquisa e difusão, que desenvolve metodologia específica do Teatro do Oprimido em laboratórios e seminários, ambos de caráter permanente, para revisão, experimentação, análise e sistematização de exercícios, jogos e técnicas teatrais. Nos laboratórios e seminários são elaborados e produzidos projetos sócio-culturais, espetáculos teatrais e produtos artísticos, tendo como alicerce a Estética do Oprimido. A filosofia e as ações desta instituição visam à democratização dos meios de produção cultural, como forma de expansão intelectual de seus participantes, além da propagação do Teatro do Oprimido como meio, da ativação e do democrático fortalecimento da cidadania.

O CTO implementa projetos que estimulam a participação ativa e protagônica das camadas oprimidas da sociedade, e visam à transformação da realidade a partir do diálogo e através de meios estéticos. Dessa forma o CTO desenvolve projetos na área da educação, saúde mental, sistema prisional, pontos de cultura, movimentos sociais, comunidades, entre outros. Por conta de sua natureza humanística e do potencial do Teatro do Oprimido, atua em todo o Brasil e em países como Moçambique, Guiné Bissau, Angola e Senegal.

Serviço:

“Mostra de Teatro do Oprimido da Paraíba e Rio Grande do Norte”
14 e 15 de maio de 2010
Local: Cine Teatro do SESC Centro Campina Grande
Rua Giló Guedes 650, Santo Antônio
Informações: (83) 3341-5800
Classificação indicativa: LIVRE
Ingressos GRÁTIS

Programação:


14 de maio: 19h - Abertura da exposição “A Estética do Oprimido” com palavras dos curingas Olivar Bendelak e Cláudio Rocha, seguido do lançamento do livro póstumo do teatrólogo e ensaísta Augusto Boal.

19h30 - Apresentação da peça de Teatro-Fórum “Quero votar e ninguém deixa”, com o Grupo CTOC da cidade de Cuité, Paraíba. Sinopse: A peça conta a história real de um adolescente que questiona a cultura do voto de cabresto em sua cidade, onde os pais obrigam seus filhos a votar em determinados candidatos que prometem emprego em troca dos votos e depois de eleitos, somem e esquecem de suas promessas. O Grupo: Formado por 11 atores-músicos entre 14 e 29 anos.

20h30 - Apresentação da peça de Teatro-Fórum “Separar por quê?”, com o Grupo Filhos da Terra da cidade de Poço Branco, Rio Grande do Norte. Sinopse: A peça conta a história real de jovens do Quilombo Acauã que são segregados do sistema de transporte escolar por racista. O Grupo: Formado por jovens entre 12 e 25 anos pertencentes ao Quilombo Acauã.

22h - Encerramento

15 de maio - Encontro de Multiplicadores do Teatro do Oprimido da Paraíba e Rio Grande do Norte.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Ex-aluno da UEPB, Bruno Gaudêncio, lançará livro em João Pessoa e Guarabira


Depois de lançar no mês de março, o livro O Ofício de Engordar as Sombras (Sal da Terra, 2009) nos municípios de Campina Grande e Boqueirão, o ex-aluno da UEPB, Bruno Gaudêncio, apresentará neste mês de Maio sua primeira coletânea poética nas cidades de Guarabira e João Pessoa.

O Ofício de Engordar as Sombras é um livro constituído por cerca de 40 poemas produzidos pelo autor entre os anos de 2003 e 2009. Quem assina o prefácio é o poeta Sebastião Costa Andrade, contando ainda com comentários críticos do poeta e jornalista José Inácio Vieira de Melo e do crítico literário José Mário da Silva. A imagem da capa foi produzida pelo desenhista e historiador Jorge Elô.

O livro ganhou recentemente algumas críticas de autores importantes do cenário literário paraibano, como Astier Basílio e Hildeberto Barbosa Filho, respectivamente no Jornal da Paraíba e no Correio das Artes. E deve receber ainda receber outras avaliações, entre eles, o do crítico literário e ficcionista campinense radicado em Recife Cristhiano Aguiar.

 Em Guarabira, o lançamento ocorrerá durante a V Semana de Humanidades (http://www.dafrainformatica.com/humanidades/index.php) , realizada pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Evento, este que será concretizado entre os dias 24 e 28 de maio de 2010. A data referente ao lançamento do livro em Guarabira ainda não foi confirmada, todavia, a obra estará à venda durante toda a semana do encontro.

Em João Pessoa, o lançamento ocorrerá durante a XIII FENART (Festival Nacional de Arte) (http://www.funesc.com.br/fenart2010/) , realizado pelo Governo do Estado da Paraíba. O lançamento será no dia 26 de Maio, a partir das 18 horas no auditório José Siqueira. Além do O Ofício de Engordar as Sombras, os autores Hildeberto Barbosa e Fernando Moura lançarão seus respectivos livros.

Bruno Gaudêncio, 24 anos, é natural de Campina Grande, Paraíba. Graduado em Jornalismo e História pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Atualmente é mestrando em História pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), onde desenvolve pesquisas sobre círculos literários na primeira metade do século XX na cidade de Campina Grande.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

LIMA BARRETO, ÍCONE DA LIBERTAÇÃO DO POVO NEGRO


Por Jomar Ricardo da Silva - Professor do DFCS da UEPB. Defendeu a Tese na UFRN em 2007 com o título: “A educação da mulher em Lima Barreto. Membro do Neab-Í (Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígena) e coordenador da Especialização em História e cultura afro-brasileira.

Afonso Henrique de Lima Barreto nasceu em 13 de maio de 1881, no Rio de Janeiro. Neto de escravos e filho do tipógrafo João Henrique Lima Barreto e da professora primária Amália Augusta Barreto, ficou órfão materno aos sete anos de idade. Posteriormente, numa de suas crônicas, deu a conhecer a consciência étnica e social que tinha de si mesmo: “Nasci sem dinheiro, mulato e livre”.

Essa autoconcepção foi proporcionada pela sociedade em que ele vivia, pelas relações com pessoas brancas e pertencentes a extratos sociais superiores aos seus. Isso porque segundo o sociólogo Otávio Ianni, “mais do que os outros habitantes da cidade, eles [negros e mulatos] têm consciência aguda do seu corpo e da sua personalidade”. Sua obra e consciência étnica estavam no âmbito da realidade que dela emerge e que com ela estabelece diálogo. Seus escritos registram os acontecimentos sociais resultantes das redefinições sucedidas no país e no mundo, durante a segunda metade do século XIX.

Nesse período o Brasil passava por transformações de ordem econômica, política e social. Poucos anos após o nascimento de Lima Barreto foi proclamada a República (1889) e sancionada a Abolição da escravatura (1888). Estes dois fatores para a historiador Emília Viotti da Costa, são, na verdade, “sintomas de uma mesma realidade”; repercussões na esfera institucional das mudanças ocorridas na estrutura do país.

Nesse contexto em que Lima Barreto se inseria, havia uma discussão sobre raça e miscigenação que associava o conceito de etnia à perspectiva de desenvolvimento político, social e econômico do país. Entre os intelectuais que debatiam o sentido da nação a partir do conceito de eugenia, encontravam-se escritores, literatos e pensadores sociais.

Ele, ao contrário de autores como Oliveira Viana e Graças Aranha que interpretavam por um viés social as ideias do evolucionismo de Lamarck e Darwin, avaliava a falta de posicionamento crítico em relação ao cientificismo predominante na época e chegou na crônica “Considerações oportunas” (1919) a contestar a adesão a esses princípios na condição de credo religioso: “Afirmava-se como artigo de fé (o que hoje não é), depois dos trabalhos de Lamarck e Darwin, mais com aquele do que com este, que os caracteres adquiridos pelo indivíduo se transmitem por hereditariedade e se fixavam na sua descendência”.

Desse modo, insurgia-se contra uma representação de ciência que, no interior campo social, produzia conhecimento para classificar, discriminar e excluir. Naquela época Lima Barreto já percebia o caráter contingente do saber dito científico e questionava a objetividade das suas verdades: “Cada autor faz um poema à raça de que parece descender ou com que simpatiza, por isto ou por aquilo. Os seus dados, as insinuações, os seus índices [...] são interpretados ao sabor da paixão oculta ou clara de cada dissertador”. Para o escritor carioca, as teorias racistas escondiam ódios às diferenças étnicas e culturais, para com isso legitimar a superioridade de um grupo, com o propósito de garantir os interesses de classe.

A trajetória do escritor Lima Barreto veio demonstrar que a ascensão de pessoas pertencentes à etnia negra, poderia se efetivar pelo desempenho intelectual. Por receber estímulos na família em que nasceu - o pai lia em francês e a mãe foi professora – desenvolveu aptidões intelectuais. Teve a ousadia de querer ser reconhecido como um grande escritor da época, entretanto, apesar de sua capacidade, foi segregado socialmente. Ao invés de responsabilizar o atraso do país por razões raciais, apontou os entraves que a economia exportadora cafeeira e o latifúndio traziam para o crescimento da nação através das obras de ficção, análises conjunturais e crônicas jornalísticas que escreveu.

Lima Barreto retratou em sua obra a cidade do Rio de Janeiro, com as tensões sociais peculiares ao período dos primeiros vinte anos da República. As suas personagens traziam os mesmos problemas que os membros dessa sociedade vivenciavam. Morreu em 1922, ainda jovem, aos 42 anos, em vista a complicações provocadas por excesso de bebida alcoólica, de colapso cardíaco, sem o reconhecimento literário que tanto almejou para si.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Projeto educacional no Amazonas adapta ensino médio aos idiomas e práticas indígenas


Por Marcelo Leite, do Caderno Mais!, da Folha de São Paulo
Crédito da Foto: Marcelo Justo

No Brasil, todo mundo é índio, exceto quem não é", diz o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro. "Só é índio quem se garante."
Está na cara que Aloisio Cabalzar, 41, antropólogo de ascendência suíça que viaja à minha frente na voadeira (lancha de alumínio), não é índio. Protetor solar e o romance policial "Alerta Negro", de Patricia Cornwell, são seus companheiros fluviais mais constantes. Mas ele fala a língua tuiuca com fluência após duas décadas de andança pela mandíbula da região da Cabeça do Cachorro.
Cabalzar, do Instituto Socioambiental (ISA), de São Paulo, é o paciente cicerone da reportagem da Folha na viagem de dez dias e várias "cachoeiras" (corredeiras) pelo extremo noroeste do Estado do Amazonas. Objetivo: conhecer as excepcionais escolas tuiuca e tucano das comunidades ao longo do rio Tiquié, afluente do Uaupés, por sua vez um tributário do rio Negro.
Metade desses dias foi padecida em voadeira, a maior parte com motor de popa de 40 HP. Menos potência, e a viagem pode se estender por uma semana -só na ida.
Já no final da primeira jornada, o antropólogo conversa com o jovem carona Marcos Resende, habitante de São Pedro (ou Pikorõaburo, em tuiuca, nome de uma larva de besouro que come o miolo do tronco do buriti), nosso destino final. O jovem tampouco parece índio. Cabelos encaracolados, boné de hip-hop virado para trás, camiseta Racionais MC's -de quem nunca ouviu uma música, aliás.
A aparência engana. Na primeira refeição em São Pedro, na casa de seu padrasto, Adão Barbosa, Marcos fala tuiuca. Serve-se com as mãos, como todos, das maniuaras (saúvas) torradas, da cutia e do beiju. Não reage com lacrimejo e espirros ao excesso de pimenta, como os convidados.
Quatro dias depois, no caxiri de despedida para os visitantes, festa na maloca regada à bebida de mesmo nome fermentada da mandioca, Marcos tocaria flauta e dançaria com outros moços e moças. Sem o boné, mas tampouco havia adorno de penas à vista -só bermudas e camisetas de muitas cores. Seu pé direito socaria o chão de terra, mantendo o ritmo e a tradição. Ex-aluno do ensino médio, Marcos já é professor.

Língua ameaçada
"Antigamente, sábio era quem obedecia às regras", pondera Higino Pimentel Tenório, 55, a autoridade reconhecida em São Pedro. Professor há 35 anos, Poani -seu nome cerimonial em tuiuca- lamenta que os jovens tenham abandonado muitos costumes.
Uma das interdições importantes, explica Poani, é a abstinência sexual de 15 dias antes de beber o caapi (bebida alucinógena similar à ayahuasca). "Quem obedece às regras tem mais poder, progride mais", afirma o professor sobre a sabedoria veiculada pelas "mirações" desencadeadas pela bebida. "[A gente vê] muita cobra colorida no vômito, entende a música e as palavras da cachoeira."
Seu orgulho é ter revertido o "êxodo rural", como se refere à saída de jovens para as antigas missões salesianas da região, Pari-Cachoeira e Taracuá, ou para a sede do município, São Gabriel da Cachoeira. A regra era abandonarem as aldeias em busca de educação.
São Pedro ficou reduzida a 14 famílias, em 2000. Hoje são 23. A língua tuiuca, antes à beira da extinção, agora é falada por todos, dentro e fora da sala de aula. Inclusive pelos alunos tucanos, desanas, yebamasãs, barás ou miriti-tapuias vindos de aldeias vizinhas para os módulos de 15 dias, intercalados com 15 dias passados na comunidade de origem, para trabalhar com os pais na roça e na pesca.
Os moços não precisam mais mudar-se para São Gabriel, 700 quilômetros rio abaixo, para cursar o ensino médio. A primeira turma do secundário da escola Utapinopona -"Filhos da Cobra de Pedra"- formou-se no ano passado, Marcos Resende entre eles (hoje dá aulas para a nova turma da escola comunitária).
Agora só lhes falta o reconhecimento de um diploma oficial. E já discutem como poderia ser um ensino superior indígena.

Paisagem como projeto

A casa de apoio construída em São Pedro pelo ISA, que auxilia a escola na localidade desde 1994, tem três ambientes. O telhado sem forro é de caraná (Mauritia carana), palmeira aparentada com o buriti (M. flexuosa). Não deixa a desejar numa região em que pode chover até 3.600 mm/ano. Resistiu, sem muitas goteiras, a vários temporais.
O quarto sem porta abriga as redes dos visitantes. A cozinha diminuta é território de Jorge Gabriel da Silva, 52, piloto de voadeira e cozinheiro da etnia desana. O cômodo maior pode ser sala de aula ou de refeição e dormitório extra, dependendo do horário.
Das paredes pendem cartazes com desenhos elaborados de perfis de vegetação em capoeiras: plantas vermelhas são as cultivadas, verdes, as pioneiras (primeiras a se instalar) e azuis, as de floresta madura.
Às 14h do dia 30 de março, excepcionalmente, é hora de aula expositiva. As tardes são em geral dedicadas a atividades como desenho de perfis de vegetação e compilação de dados em tabelas, não à exposição.
A rotina foi alterada para acomodar a agenda da reportagem, que pela manhã acompanhou uma atividade de campo dos alunos (coleta de mel e reprodução de colmeias de meliponicultura -criação de abelhas sem ferrão).
São 19 alunos na sala, 15 homens e 4 mulheres na faixa de 15 a 19 anos. Há dois computadores laptop, além daquele em que Pieter-Jan van der Veld, 46, agrônomo holandês contratado pelo ISA, lê o tema do dia: "Apresentar uma pesquisa sobre paisagem florestal". Os três aparelhos e a única lâmpada do recinto são alimentados por energia acumulada em baterias de caminhão por um painel solar fotovoltaico.
O português sai com um acento lusitano e palavras esparsas em espanhol, mas Wisõka -Esquilo, apelido do professor em tuiuca, por causa dos cabelos avermelhados- garante que os jovens entendem.
Todos ali falam pelo menos três idiomas (português, tuiuca e tucano, a língua franca do Tiquié) e escrevem as duas primeiras. Recebem visitantes do Brasil todo e do exterior, interessados na experiência peculiar de educação indígena. "O meu é só mais um sotaque do português para eles", tranquiliza Van der Veld.
A aula difere muito do ensino médio tradicional nas redes públicas de outros Estados e das grandes cidades amazonenses. Além dos módulos em blocos intercalados de 15 dias, dura quatro e não três anos, divididos em ciclos de dois. Em lugar de um currículo segmentado em disciplinas, os alunos aprendem com base em pesquisas e projetos temáticos.
O projeto atual é um levantamento de "paisagens", ou fisionomias vegetais, eleitas pela comunidade -alunos, pais e professores. O estudo se concentra nas quatro principais: floresta ("makaruku"), capoeira ("wiariro", roça abandonada), igapó ("boareko", floresta de inundação sazonal) e campinarana ("tataboa", uma espécie de caatinga amazônica que viceja em solos arenosos e encharcados, origem da "água preta" dos igarapés e rios da bacia do Negro).
Há dezenas de subdivisões para registrar concentrações de recursos importantes. "Netahta" é buritizal; "mihpitahta", açaizal. Em foco, na pesquisa, estão os caranazais ("mui boa"), onde folhas para renovar telhados são colhidas. Se o estoque natural não for bem manejado, a matéria-prima escasseia, o que pode forçar a mudança de local da aldeia.
Na semana anterior, o grupo passara quatro dias acampado, identificando, contando e medindo árvores e arvoretas com mais de um dedo de espessura num transecto (área delimitada) de mil metros quadrados. Os dados coletados são organizados em listas (todos os tipos de árvores encontradas), depois em tabelas (com as quantidades de cada tipo).
Listas e tabelas são necessárias para produzir gráficos, explica Van der Veld. A tradução para o tuiuca fica a cargo do professor habitual da classe, José Barreto Ramos, 50. Ele também se chama Poani, um dos nove nomes de homem disponíveis na língua tuiuca; para as mulheres, há seis.
Nesse idioma, a entonação modifica o significado das palavras. Tudo soa incompreensível para o forasteiro, mas a tradução vem entremeada de palavras portuguesas: "gráfico", "tabela", "lista"...
Conceitos inexistentes numa cultura em que, poucas décadas atrás, só se contava até 20 (soma de todos os dedos e artelhos). "O próprio conhecimento quem manifesta é a língua", teoriza o outro Poani (Higino Tenório).
A aula evolui para a confecção de um gráfico comparando as quantidades de três árvores em dois transectos. Todos os alunos têm pranchetas, cadernos e réguas. Anotam tudo que o professor escreve no quadro, em português, com letras de forma e caligrafia bem desenhada. O silêncio e a atenção são dignos de nota, para quem conhece a atmosfera do ensino médio nas capitais, retratada no filme "As Melhores Coisas do Mundo", de Laís Bodanzky.
Terminada a explicação da tarefa, a dificuldade se torna visível: raros são os que começam de imediato a traçar o gráfico de barras. Os alunos empacam na correspondência entre número de árvores e centímetros do eixo y e na escolha da escala para a figura caber na página. Só então começam a falar entre si, e o observador conclui que ajudam uns aos outros. Van der Veld dá a tarefa por completa após uma hora e meia de aula.
"A parte difícil é a matemática", diz o holandês. "Enfrentam problemas com coisas técnicas e abstratas, mas não com a parte prática." Na sua avaliação, os alunos da escola tuiuca têm nível melhor que os técnicos de Rondônia com quem trabalhou por um ano em 1998, para fazer amostragens de solo no macrozoneamento do Estado. "Os problemas são os mesmos da educação do Brasil [todo]."

Caranazal abusado

Dois dias depois, a reportagem entra na mata com Van der Veld e cinco estudantes, para uma demonstração de levantamento num caranazal. Há dificuldade para acompanhar a marcha, firme e aplicada como a caligrafia exibida em sala de aula. São 45 minutos para cobrir cerca de dois quilômetros desde a margem do Tiquié, segundo o GPS. O jornalista e o repórter-fotográfico aprendem rápida e dolorosamente o significado da palavra "caba" (marimbondo).
Chegamos ao caranazal pouco depois das 10h. Embora a palmeira não componha mais que 3% das 139 plantas inventariadas pelos tuiucas nessa paisagem vegetal, suas folhas em leque estão por toda parte.
Visível, também, é a decepção do agrônomo professor: só há indivíduos juvenis de Mauritia carana, nenhum adulto com tronco, muito menos com os 15 metros que pode alcançar na fase reprodutiva. A maioria dos caranás é "pu" (criança).
"Um caranazal abusado", decreta o holandês. Nem mesmo a regra tradicional de deixar pelo menos três folhas em cada pé parece ter sido observada pelos últimos coletores. O manejo inadequado implica que a área precisará de muitos anos para voltar a ser explorada, porque não sobraram plantas-mãe para lançar sementes e recompor a população.
Não deixa de ser didático para os tuiucas Jorge Rochas Gutierrez, Josival Azevedo Rezende e Walter Marques Tenório, além de Jodair de Jesus (tucano) e Angel Maria Sanches (bará), os estudantes de ensino médio encarregados da demonstração.
Sua tarefa é demarcar um transecto, a área para levantamento da paisagem. Começam por assinalar uma árvore de porte facilmente identificável na mata rala e fixar nela uma plaquinha de metal. É o ponto de referência, marcado no GPS.
A partir dele se estende a trena por 20 m (numa pesquisa real são 100 m), iniciando a demarcação do polígono com 10 m de largura. Fincam-se estacas a cada 5 m, para fixar barbantes perpendiculares que dividirão a área em quatro setores, para facilitar a contagem.
O ângulo é definido com auxílio de bússolas de fundo transparente, que permitem enxergar o fio por baixo e alinhá-lo. Van der Veld pergunta quanto é um ângulo reto, para marcar o canto do retângulo do transecto. A primeira resposta é 50, logo corrigida para 90 -não sem algum debate.
Os alunos têm então de somar ou subtrair os 90 da orientação registrada para a trena (230), e a barreira da abstração volta a materializar-se. Fazem e refazem contas a caneta na palma das mãos, até chegar às respostas corretas (320 e 140). Quando surgem quantidades negativas, então, a dificuldade cresce de forma exponencial, conta o professor holandês.

De volta à tanga

Juntos, os rapazes acabam resolvendo todos os problemas que Van der Veld propõe. No processo, ganham ferramentas e habilidades para entender melhor e manejar a dinâmica natural de um recurso decisivo para os tuiucas e seus vizinhos. Já se foi o tempo em que os jovens tinham de aprender com livros -dos padres salesianos ou do MEC- que falavam de maçãs e uvas, frutas que nunca chegam ali.
"Abrimos opção para cada jovem buscar qual tipo de conhecimento vai buscar fora para solucionar os problemas da comunidade", afirma o líder Higino Tenório. Os projetos de pesquisa sempre têm relação com o sustento material e cultural dos tuiucas e dos povos vizinhos (entre os quais buscam mulheres para casar): a palha do caraná, peixes e piscicultura, meliponicultura, roça -mas também mitos, cantos, adornos e benzimentos.
A ideia por trás da nova escola sempre foi casar a "ciência dos brancos" com a valorização do conhecimento indígena. E, no caminho, aproximar moços e velhos, revivendo regras cujo cumprimento estava se tornando exceção. "Nossos antepassados [homens] passavam três meses acampados na mata, aprendiam a fazer cestaria", conta Tenório. "[Eram] regras para dotá-los de conhecimento, força e espírito."
Na própria comunidade de São Pedro houve resistência à proposta de educação indígena e alfabetização em língua tuiuca. Fiéis ao ensino rígido dos salesianos, que os ensinaram a ler, escrever e contar até mais que 20 e os ajudaram a libertar-se das dívidas com os patrões da borracha e comerciantes dos regatões, muitos pais acharam que seria um retrocesso.
"Nossos próprios parentes não chegavam a entender", rememora o professor José Ramos. "[Achavam que] atrapalharia, traria atraso, os filhos não poderiam aprender português, voltariam para trás e a usar tanga como nossos antepassados", diz o outro Poani, sempre de calça comprida, cinto e camisa polo.
"Os padres mandavam bater nas crianças. Isso acabou", comemora. "A escola agora tem computador, tecnologia, oficinas, bússola e GPS. Nossos filhos só falavam tucano, custou dois, três anos para voltarem a falar tuiuca. Quando um aluno está doente, manda carta [para o professor] escrita em tuiuca."

Ensino superior indígena

As resistências comunitárias foram pouco a pouco vencidas. Hoje, a língua tuiuca ganhou algo que nunca teve: uma literatura própria. Fruto de duas décadas de trabalho do casal Flora Dias Cabalzar e Aloisio, o "Arusu" (arroz).
Eles foram "peças fundamentais", segundo Higino Tenório. "Eu penso várias ideias, mas não sei colocar as palavras certas", diz o coautor tuiuca. "Eles sabem escrever, ouvindo nossas ideias."
Já são oito livros publicados no idioma em uma década. Um ainda está no prelo: "Utapinopona Kuye Poseminiã Niromakaraye" (Adornos Cerimoniais dos Tuiucas). Resultou de um projeto temático da escola em que alunos recolheram entre os mais velhos descrições, usos e explicações sobre a origem dos ornamentos.
A experiência "sui generis" de educação indígena na região da Cabeça do Cachorro, que inclui os tucanos do Tiquié e os baniuas do rio Içana, gerou também várias teses e publicações em português. O livro mais recente é "Manejo do Mundo - Conhecimentos e Práticas dos Povos Indígenas do Rio Negro, Noroeste Amazônico" (organizado por Cabalzar, do ISA), lançado num seminário com o mesmo título, que se realizou de 8 a 13 de abril em São Gabriel da Cachoeira.
O seminário reuniu representantes dos vários povos da região, inclusive da Colômbia, para trocar experiências de educação baseadas em projetos de pesquisa sobre a natureza e delinear como poderia ser um ensino superior indígena. Trata-se de formar professores de ensino básico com nível universitário, como exige a lei, mas com currículo que vá além da formalização muitas vezes medíocre oferecida por universidades da Amazônia.
O encontro resultou numa lista com 13 desejos para um ensino superior indígena. Coisas como ser inovador, ter relação com o território da bacia do rio Negro e conexão direta com as comunidades. "Qual seria o conhecimento mesmo, de nível superior, para o jovem conseguir viver aqui?", pergunta Higino Tenório. "É inviável querer transformar o índio em intelectual. Quem faz curso superior quer ir para a capital."
Mais sintomática é a lista do que os índios não querem que ele seja: só uma licenciatura intercultural, numa única língua, com predominância do conhecimento científico ocidental e estruturas burocratizadas. A burocracia estatal, aliás, é no momento a grande pedra no caminho das experiências educacionais do rio Negro.
Enquanto se limitavam ao ensino fundamental, as peculiaridades da educação comunitária foram sendo acomodadas com as regras municipais de São Gabriel da Cachoeira, onde cerca de 90% da população de 42 mil habitantes e até o prefeito são indígenas. Ao alcançar o nível médio, porém, passaram para a alçada da Secretaria Estadual de Educação amazonense, e o reconhecimento oficial das turmas já formadas ainda não saiu.
Da duração -quatro e não três anos- à inexistência de avaliação com notas ou de conteúdo curricular padronizado, pouca coisa se enquadra nas normas do Conselho Estadual de Educação do Amazonas.
"[O ensino médio tuiuca] é um projeto avançado, até para a educação indígena", afirma o professor de física e matemática Inafran da Silva Bastos, técnico da Gerência de Educação Escolar Indígena da secretaria estadual. "Na hora de reconhecer, a própria Seduc não estava preparada. É só uma questão de tempo e de se adequar -no mínimo dois a três meses."
A nova gerente da área, Alva Rosa, da etnia tucano, tomou posse em 19 de abril, Dia do Índio. Bastos informa que a gerência trabalha na adaptação do currículo estadual para a educação indígena, mas que o processo ainda está "no início".

Aracu, acará e araripirá

No último dia de março, a reportagem desce o Tiquié até a comunidade tucano em Cachoeira do Caruru, menos de meia hora de voadeira com o motorzinho de popa de 15 HP. Vamos conhecer a estação de piscicultura montada em 1999 por uma associação de 12 comunidades tucanas e tuiucas no Alto Tiquié.
O guia da visita é o coordenador-gerente do projeto, Lucas Alves Bastos. A escola, em paralelo ao projeto de piscicultura, desenvolveu uma pesquisa relacionando enchentes e vazantes, chuvas, piracema (desova dos peixes) e constelações que "caem" do céu no poente, como a da Jararaca (em novembro).
O projeto tem por meta reproduzir e distribuir para as comunidades espécimes das espécies nativas aracu-riscado (Leporinus agassizii), aracu-três-pintas (L. friderici), acará-trovão (Satanoperca jurupari) e araripirá (Chalceus macrolepidotus). Machos e fêmeas maduros são capturados e têm a hipófise retirada para extração de hormônio, depois injetado debaixo da nadadeira peitoral de outros peixes para estimular a produção de gametas (espermatozoides e óvulos).
Controlando a temperatura dos animais, os técnicos indígenas definem o momento de espremer os peixes e colher o material para fertilização em bacias, que exigem trocas de água de dez em dez minutos. Transfere-se o material para incubadoras com água corrente, durante sete dias, para que os embriões eclodam e se desenvolvam. Eles são depois contados e transferidos para os viveiros, tanques de 10 m x 20 m x 1,5 m escavados no terreno.
No momento, as incubadoras estão vazias. Uma semana antes, 34.300 pós-larvas de araripirás, com três milímetros, foram produzidas em Caruru. Cerca de 2.000 sobreviverão nos tanques e alcançarão dez centímetros, quando serão enviadas para engorda nos viveiros comunitários e familiares, como os de São Pedro.
O dia anterior fora de mutirão para cavar um terceiro viveiro na vizinha aldeia tuiuca, parceira dos tucanos de Caruru. Meia centena de homens, mulheres e crianças trabalhavam juntos, sob o sol a pino. Já há dois lagos, mas um está vazando. É preciso abrir outro, trabalho para cinco dias.

Palavra de índio

"Nossa ideia é fazer criação para o rio descansar", explica Higino Tenório, líder dos trabalhos. "Com tecnologia -pilha, zagaia, malhadeira- a pesca deixou de ser seletiva e inteligente, como era feita com pari [armadilha de varas], e se tornou predatória."
Tuiucas e tucanos do Tiquié entendem que foram gente-peixe, antes de se transformarem em gente-verdadeira, e assim escolheram permanecer. Para isso, precisam de flautas do jurupari (que mulheres e crianças só podem ouvir, não ver), de folhas do caraná, aracus, acarás e araripirás -além de uma tecnologia que fuja à norma da superexploração.
Em duas palavras, buscam na prática as tão faladas "inovação" e "sustentabilidade" e elegeram o ensino como canoa para realizar a travessia. "[A escola] é a instituição externa que eles conseguiram manejar", resume Aloisio Cabalzar.
A regra do senso comum vale também para os índios: educação é a garantia de algum futuro. Um futuro índio.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Estamos com fome de amor...


Por Arnaldo Jabor, do jornal O Dia



O que temos visto por aí???

Baladas recheadas de garotas lindas, com roupas cada vez mais micros e transparentes.

Com suas danças e poses em closes ginecológicos, cada vez mais siliconadas, corpos esculpidos por cirurgias plásticas, como se fossem ao supermercado e pedissem o corte como se quer... mas???

Chegam sozinhas e saem sozinhas...

Empresários, advogados, engenheiros, analistas, e outros mais que estudaram, estudaram, trabalharam, alcançaram sucesso profissional e, sozinhos...

Tem mulher contratando homem para dançar com elas em bailes, os novíssimos "personal dancer", incrível.

E não é só sexo não!

Se fosse, era resolvido fácil, alguém duvida?

Sexo se encontra nos classificados, nas esquinas, em qualquer lugar, mas apenas sexo!

Estamos é com carência de passear de mãos dadas, dar e receber carinho, sem necessariamente, ter que depois mostrar performances dignas de um atleta olímpico na cama ... sexo de academia . . .

Fazer um jantar pra quem você gosta e depois saber que vão "apenas" dormir abraçadinhos,
sem se preocuparem com as posições cabalísticas...

Essas coisas simples, que perdemos nessa marcha de uma evolução cega.

Pode fazer tudo, desde que não interrompa a carreira, a produção...

Tornamo-nos máquinas, e agora estamos desesperados por não saber como voltar a "sentir", só isso, algo tão simples que a cada dia fica tão distante de nós...

Quem duvida do que estou dizendo, dá uma olhada nos sites de relacionamentos "ORKUT", "PAR-PERFEITO" e tantos outros, veja o número de comunidades como: "Quero um amor pra vida toda!", "Eu sou pra casar!" até a desesperançada "Nasci pra viver sozinho!"

Unindo milhares, ou melhor, milhões de solitários, em meio a uma multidão de rostos cada vez mais estranhos, plásticos, quase etéreos e inacessíveis, se olharmos as fotos de antigamente, pode ter certeza de que não são as mesmas pessoas, mulheres lindas se plastificando, se mutilando em nome da tal "beleza"...

Vivemos cada vez mais tempo, retardamos o envelhecimento, e percebemos a cada dia mulheres e homens com cara de bonecas, sem rugas, sorriso preso e cada vez mais sozinhos...

Sei que estou parecendo o solteirão infeliz, mas pelo contrário...

Pra chegar a escrever essas bobagens?? (mais que verdadeiras) é preciso ter a coragem de encarar os fantasmas de frente e aceitar essa verdade de cara limpa...

Todo mundo quer ter alguém ao seu lado, mas hoje em dia isso é julgado como feio, démodê, brega...

Alô gente!!! Felicidade, amor, todas essas emoções fazem-nos parecer ridículos, abobalhados...

Mas e daí? Seja ridículo, mas seja feliz e não seja frustrado...

"Pague mico", saia gritando e falando o que sente, demonstre amor...

Você vai descobrir mais cedo ou mais tarde que o tempo pra ser feliz é curto, e cada instante que vai embora não volta mais...

Perceba aquela pessoa que passou hoje por você na rua, talvez nunca mais volte a vê-la, ou talvez a pessoa que nada tem haver com o que imaginou mas que pode ser a mulher da sua vida...

E, quem sabe ali estivesse a oportunidade de um sorriso a dois...

Quem disse que ser adulto é ser ranzinza ?

Um ditado tibetano diz: "Se um problema é grande demais, não pense nele... E, se ele é pequeno demais, pra quê pensar nele?"

Dá pra ser um homem de negócios e tomar iogurte com o dedo, assistir desenho animado, rir de bobagens e ou ser um profissional de sucesso, que adora rir de si mesmo por ser estabanado...

O que realmente, não dá é para continuarmos achando que viver é out... ou in...

Que o vento não pode desmanchar o nosso cabelo, que temos que querer a nossa mulher 24 horas, maquiada, e que ela tenha que ter o corpo das frutas tão em moda, na TV, e também na Playboy e nos banheiros, eu duvido que nós homens queiramos uma mulher assim para viver ao nosso lado, para ser a mãe dos nossos filhos, gostamos, sim, de olhar, e imaginar a gostosa, mas é só isso, as mulheres inteligentes entendem e compreendem isso.

Queira do seu lado a mulher inteligente: "Vamos ter bons e maus momentos e uma hora ou outra, um dos dois, ou quem sabe os dois, vão querer pular fora, mas se eu não pedir que fique comigo, tenho certeza de que vou me arrepender pelo resto da vida"...

Porque ter medo de dizer isso, porque ter medo de dizer: "amo você", "fica comigo", então não se importe com a opinião dos outros, seja feliz!

Antes ser idiota para as pessoas que infeliz para si mesmo!

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Sons da Paraíba atravessando continentes


Por Oziella Inocêncio, da ASCOM/UEPB

O Brasil é só samba? E a Paraíba, é apenas forró? Para muito além dos rótulos limitadores, que se propagam por aí, o produtor paraibano Arthur Pessoa, líder da banda campinense Cabruêra caiu na estrada mundial para apresentar os inúmeros matizes musicais que vem sendo desenvolvidos no Estado. Para isso, organizou uma compilação apresentando artistas locais, com um título, digamos, sugestivo: "Brazil More Than Samba: Sounds from Paraíba" (Brasil Mais que Samba: Sons da Paraíba).

O CD reúne músicas de 20 artistas, entre eles Toninho Borbo e Biliu de Campina, e bandas da Paraíba, a exemplo de Brazilian Trombone Ensemble, Jaguaribe Carne, Chico Correa e Burro Morto. "O Brazil More Than Samba criou uma plataforma inédita para exportação da produção musical local, levando a música dos artistas paraibanos ao encontro de profissionais da música de todos os continentes, através da participação do projeto nas maiores feiras internacionais de música", apontou Arthur.

De acordo com Arthur, o CD já foi levado às feiras da Dinamarca, Argentina e França, conforme previa o projeto. "O saldo que faço é muito positivo. A expectativa é que a iniciativa continue e que, ainda este ano, tenhamos uma segunda edição do Brazil More Than Samba, desta feita numa caixa com cinco CD’s”, explicou.

Ele informou que cada compacto trará um gênero musical distinto, abrangendo instrumental e jazz, rock, regional, eletrônico e hip/hop, e world music. Pessoa acrescentou que a efetivação deste segundo projeto será fundamental para agregar outros artistas que não participaram da coletânea nesta primeira edição. “A verve criativa da Paraíba é muito rica. Precisamos aglutinar mais talentos”, destacou.

O projeto teve o patrocínio do Fundo de Incentivo à Cultura (FIC), do Governo do Estado da Paraíba, com o apoio do Sebrae. Além do CD, a divulgação do projeto também conta com outros materiais como cartazes e encarte em inglês com os contatos dos artistas.

Confira os artistas que participam do projeto "Brazil More Than Samba: Sounds from Paraíba":

Burro Morto - Cabaret
Brazilian Trombone Ensemble - Fantasia Carnavalesca
Aerotrio - Gato Preto
Totonho e Os Cabra - Você tá Doida pra me Dar
ChicoCorrea - Cantador
Escurinho - Lá Vem a Onda
Jaguaribe Carne - Saltos
Tocaia da Paraíba - Tabajara
Cabruêra - Passarada
Biliu de Campina - Se Toque no Forró
Vates e Violas - Ondinas
Toninho Borbo - Ser Humano
Eleonora Falcone - Pedaço de Sol
Gunjah Reggae Band - Coco Nyabinghi
Emboscada - A Trilha
Zé Viola Progressive Band - O Negro Albino
Unidade Móvel - As Pedras
La Gambiaja - Des Oiseaux
Cabeça Chata - Miudim
Madalena Moog - Hey, Amigo!