Por: Professora Marlene Alves (Reitora da Universidade Estadual da Paraíba - UEPB)
Neste dia 15 de março de 2012, a Universidade Estadual da Paraíba completa 46 anos de sua fundação. A Lei Municipal nº 23, de Campina Grande, sancionada pelo então prefeito Williams Arruda, instituía um marco na vida da cidade, pela compreensão do momento vivido no país e a necessidade de criação de uma Instituição de Ensino Superior, nos moldes de tantas outras Universidades criadas no país.
A história desta Universidade está marcada, desde seu nascedouro até a atualidade, mais pelo conflito e pela luta do que pela calmaria. Ao mesmo tempo, sua trajetória de instabilidades tem se revelado pródiga em apresentar ciclos de crescimento e desenvolvimento que, de um modo ou de outro, sempre terminaram por fortalecê-la. A criação da FURNe nos anos 60 do século XX, na condição de herdeira da FUNDACT e, ao mesmo tempo, aglutinadora de cursos superiores e faculdades isoladas, revelava a visão dos idealizadores daquele tempo e a sua compreensão da importância de uma instituição de ensino superior fincada no interior do Nordeste, que buscava a instauração de um novo ciclo de desenvolvimento.
Até os anos 80, a despeito de tantas crises, a URNe se manteve firme em seu papel. O princípio da democratização interna em meados da década foi o primeiro passo de um longo caminho até a estadualização, em 1987. Se a criação da UEPB, incorporando ativo e passivo da antiga URNe, foi uma enorme conquista, essencialmente pela gratuidade do ensino, antigas mazelas não foram resolvidas e o Estado sempre tentou desobrigar-se de suas responsabilidades. Assim registra a história!
O reconhecimento pelo MEC, em 1996, foi um passo importante para sua afirmação como Universidade, mas não gerou grandes mudanças na cultura política da instituição, notadamente no que se refere ao seu financiamento, razão pela qual as crises continuaram a acompanhar a instituição até a metade da década seguinte.
O ano de 2005 é um verdadeiro marco na história da Universidade da Paraíba. Passa a viger a Lei 7.643, 06/08/2004, LEI DE AUTONOMIA FINACEIRA DA UEPB, sancionada e saudada como a esperança de soerguimento, consolidação e verdadeira refundação daquela Universidade que outrora foi sonhada como instrumento de conhecimento e desenvolvimento para o Nordeste brasileiro, sonho inscrito em seu nome, Universidade Regional do Nordeste, e no brasão que a representava: Luz para a Terra e Para os Homens.
A experiência advinda com o exercício da autonomia financeira, destacadamente entre os anos 2005 e 2009, trouxe para a UEPB uma fortuna acadêmica e científica incalculável, traduzida em investimento maciço nas pessoas, na infraestrutura, nas condições de trabalho, na possibilidade sonhada e agora posta em prática, de se edificar uma Universidade na acepção mais pura da palavra, capaz de produzir conhecimento, formar cidadãos capazes e comprometidos socialmente, preservar e difundir a cultura, além de um processo radical de enraizamento com a vida do povo, principalmente das camadas mais populares da sociedade.
Este povo, maioria numérica e socialmente minoritária, começou a compreender que poderia dispor de sua Universidade e que esta instituição nada tem a dever às grandes Universidades, no sentido de se tornar uma Universidade científica e, ao mesmo tempo, do povo e para o povo. O crescimento vertiginoso, a proliferação de projetos e programas, o fortalecimento do vínculo social, a consolidação e reconhecimento científico em várias áreas, o respeito acadêmico, a referência respeitosa e eficiente no uso dos recursos públicos começaram a fomentar nos espíritos mais céticos a esperança de que estávamos a caminhar para um futuro de potência e êxito, a partir da realidade própria, edificando cada pequena ação sobre as bases históricas, mas sem perder a contribuição da modernidade, sem descuidar do olhar para o presente e o horizonte futuro.
Reconhecidamente, o ano 2009 foi o ápice da UEPB, no exercício da sua Autonomia, em relação ao respeito e aplicação efetiva da Lei por parte do governo do estado. Depois de fevereiro daquele ano, resolvido breve impasse e conflito de interpretação da Lei, experimentamos o cumprimento rigoroso dos preceitos legais estabelecidos e a UEPB respondeu com crescimento e mais compromisso social. A partir de 2010 e 2011, vários revezes indicaram que estávamos a enfrentar um novo momento e que haveríamos de multiplicar nossa capacidade de superar desafios. Se por um lado um governo em seus últimos momentos aplica um duro golpe aos cofres da instituição, por outro lado, o governo que inicia se utiliza exatamente desta base e argumento para duplamente penalizar a instituição.
Em 2011, mesmo a despeito de todas as tentativas de diplomacia institucional, de diálogo franco, de interlocução administrativa e política, a instituição foi vitimada pela segunda vez. O ano de 2011 poderia ter sido o pior dos últimos sete anos, mas a vida nos provou que “nada poderia estar tão ruim que não pudesse piorar.” Pois bem! Estamos a enfrentar turbulências que nos indicam a entrada em mais um ciclo de crise e, como sempre nas marchas e contramarchas da história, com prejuízo enorme à construção de um modelo ousado de universidade autônoma e, por consequência, também, de uma sociedade onde as relações de poder, não prescindindo de se entranharem no tecido social da instituição, poderiam ser estabelecidas democraticamente com a sua libertação, sua livre busca do saber, da ciência, da contribuição à sociedade, sendo por esta referendada, porém, sem a tutela do Estado. Mais sério ainda, sem a tutela de um governo. Esta experiência nós já conhecemos.
A novidade é que, mesmo experimentados nas lutas em defesa da instituição, a forma e o conteúdo das últimas investidas governamentais sobre esta Universidade de quase meio século e que vinha em curva ascendente de crescimento e consolidação, o golpe atual tem causado danos que, se não irreparáveis, mas que trarão consequências por muitos anos.
Hoje, o grande entrave à manutenção de um bom ritmo de crescimento e desenvolvimento, acontece por conta de um debate relativamente permanente, mas que tomou contornos dramáticos recentemente: qual o tamanho de uma Universidade que o Estado da Paraíba suporta? Quais devem ser os contornos geográficos desta instituição mantida com os recursos de todo o povo paraibano? Até onde ela deve ir e até onde ela pode chegar?
Coincidem, hoje, maturidade e crise. Infelizmente, não se coadunam do ponto de vista de funcionar a crise como momento de tensão que leva a sínteses dialéticas. Fosse uma crise provocada por fatores reais, externos ao controle da vontade dos que comandam a política seria compreensível. O que vivenciamos hoje é uma crise de compreensão de um modelo. Uma crise gestada de dentro da estrutura do Estado, mais precisamente do Governo, para a Universidade do seu Estado. Um paradoxo: A crise é de um modelo de autonomia e ação política-administrativa que vem dando certo, obtendo êxitos fenomenais, contra uma vontade de emperrar, tutelar, censurar, controlar efetivamente os passos e as ações livres de uma comunidade de pensantes, cientistas e intelectuais que buscam construir um destino social, em atendimento ao desiderato institucional da UEPB, em detrimento do escopo do que querem os que apenas temporariamente governam.
Outras questões que devem estar necessariamente agregadas a esta: qual a importância estratégica de uma Universidade Estadual em um Estado periférico? Quais as ligações entre formação de nível superior e qualidade de vida, desenvolvimento social, geração de riqueza, cidadania? Como superar o atraso histórico em nossa Paraíba sem uma política pública de expansão de vagas no ensino superior, sem o comprometimento de sua instituição com o desenvolvimento do Estado e a serviço do seu povo? Quais referências e consequências danosas poderão ser encontradas no futuro se o investimento em educação for visto sempre, sob a ótica dos governantes, como despesa?
De uma coisa estejamos cientes: todo governante, representante, educadores/as, trabalhadores/as, cidadãos e cidadãs, precisam desenvolver a capacidade de compreender a importância disto que se chama Universidade, sua autonomia e seu papel indispensável a quaisquer projetos de desenvolvimento social. Esta compreensão é indispensável para que se crie uma conduta cotidiana pautada em um projeto estratégico. Formular intenções sobre o futuro, indicar desejos, anunciar vontades... só terão sentido se vierem agregados a uma boa prática, assentados sobre planos exequíveis e a clareza de compreensão sobre o papel de uma instituição como a Universidade Estadual da Paraíba.
A UEPB é de todo o povo paraibano, maior que sua comunidade, maior que seus dirigentes, maior que seus governantes. Viva a UEPB!!!
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