Por Jussara Carneiro (docente da UEPB)
João Pessoa, Paraíba, calorosa manhã de uma sexta-feira, no dia 16 de março do ano de 2012. No teatro Paulo Pontes, localizado no Espaço Cultural, enquanto se espera, entre outras coisas, que as águas de março apareçam para fechar o verão, o governador da Paraíba discursa pela ocasião de posse aos(as) professores estaduais aprovados no último concurso publico, momento em que é interrompido pelos gritos e apitos de manifestantes da Universidade Estadual da Paraíba, em numero bem menor do que aqueles(as) que se encontravam no recinto, protestando pelo não cumprimento da lei estadual que garante autonomia financeira da instituição. Com a presença sonoramente auto anunciada dos(as) manifestantes o governador convida-os a sentar. A platéia aplaude. Beleza, eu também aplaudiria!
A partir daí o que assistimos é lamentável. O governador claramente incita os(as) professores(as) presentes contra os(as) manifestantes da UEPB, sob a alegação de que estariam sendo mal educados e desrespeitando aquele(as) que estavam ali para serem empossados(as). Peraí governador, que destempero é esse? Onde foi que você aprendeu que manifestação pública contra medida implementada por gestor que desagrada a população é falta de educação? Essa postura não faz parte da sua trajetória, pelo menos da que eu conheci e na qual, por tanto tempo, apostei. Além disso, pela forma como o governo estadual tratou professores(as) prestadores(as) de serviço, vossa excelência perdeu o privilégio de se colocar como porta-voz de educação e respeito no trato para com os(as) mesmos(as).
Em seguida, outra surpresa. O governador assume abertamente, pela primeira vez, que realmente interferiu no repasse de recursos para a UEPB e desrespeitou a Lei da autonomia financeira, embora tente dizer depois que a respeita, assim como faz com os poderes judiciário e legislativo paraibanos. A justificativa? Dentre as pérolas proferidas pelo governador, punir uma corporação que quer manter privilégios ou pelo menos uma casta dessa corporação; devolver a UEPB ao povo paraibano ou republicanizá-la, já que gosta tanto da expressão. Comparando o ano de 2011 com períodos anteriores, o governador questiona ainda o uso da verba com custeio por parte da universidade, apontando o uso de recursos com diárias e viagens, embora não fique claro por parte de quem e porque. Mas, o mais serio foi afirmar para os/as presentes que a contestação ao não repasse de recursos a UEPB, como previsto em lei, se relaciona ao fato de não querermos uma educação básica fortalecida no estado porque isso ameaça privilégios.
Peraí, governador, vamos por parte. Em primeiro lugar, sua concepção de república e o método que usa para implementá-la andam um tanto quanto questionáveis porque você se esqueceu de aliá-la a uma outra coisa muito importante, que é a democracia, sobretudo a democracia participativa. Vossa excelência se esquece de que existem órgãos (internos e externos) para o exercício do controle social referente ao emprego desses recursos e que fiscalizá-los é também prerrogativa nossa, como professores/as, docentes, discentes, técnicos e comunidade beneficiada pela UEPB? Vossa excelência vai republicanizar a UEPB sem democracia, como, na base da canetada, colocando o povo da Paraíba contra a instituição?
Se tiver pensando nisso sugiro que trate de melhora sua imagem primeiro. Por acaso vossa excelência já parou para se perguntar se a grande comunidade que integra a UEPB, que está para muito além dos muros que a circundam, aprova o tratamento que você tem dispensado a instituição? Pergunte a nós, pergunte a quem faz a UEPB, pergunte ao povo da Paraíba. Se vossa excelência soubesse (nos) escutar mais talvez não andasse com uma imagem tão desgastada nesse estado. Outra coisa: por que vossa excelência não pede o mesmo rigor ao emprego dos recursos por parte do judiciário e do legislativo e só mostra os dentes para a UEPB? Vossa excelência quer mesmo fazer a comparação? Pois então compare os recursos empregados e a população beneficiada e depois pergunte ao povo da Paraíba qual emprego considera mais útil e legítimo. Não ficou muito claro essa sua crítica ao uso de recursos de custeio para diárias e viagens.
Vossa excelência defende isso, em princípio, para todos(as) os(as) servidores(as) públicos ou só para alguns? Quem paga suas viagens de trabalho? Ainda sobre a verba de custeio, porque o prédio novo do museu de artes da UEPB aparece na propaganda das ações que o governo do estado faz em Campina? Explique para o povo que ele foi construído com recurso público do estado da Paraíba, incluído na verba de custeio que a UEPB recebe. Para completar, governador, que equação troncha é essa que vossa excelência estabeleceu entre as reivindicações da UEPB e o interesse no enfraquecimento da educação básica? Que o fortalecimento da educação básica ameaça privilégios eu também não tenho dúvidas, mas privilégios de quem, cara-pálida, os nossos, quadro funcional e alunos/as da UEPB?
Não sei porque razão mas quando assisti ao vídeo que desencadeou essa minha reflexão, de imediato me veio a lembrança a ocasião em que o ex presidente da república, Fernando Henrique Cardoso, chamou os brasileiros(as) aposentados(as) de vagabundos, por cometerem, senão o crime, pelo menos a infâmia de se aposentarem “tão cedo” em um país de pobres e miseráveis. Talvez seja porque apesar dos episódios estarem em contextos diferentes, a questão de fundo presente nos mesmos é a mesma.
No receituário capitalista e neoliberal é assim mesmo: aposentado é vagabundo porque para de trabalhar num país de pobres e miseráveis e jovens deixam de ter acesso a educação superior porque falta dinheiro para educação básica. Vossa excelência, porém, não se esqueça de que a plataforma que apresentou ao povo da Paraíba é bem diferente disso. Por essa razão mesmo surpreendeu-me, mais do que eu poderia supor que me surpreenderia, a postura de vossa excelência no trato com os(as) servidores da UEPB. Foi bom ter acesso as imagens para tirar minhas próprias conclusões porque há muito tempo a nossa imprensa não anda confiável, se é que um dia foi. Olhando o vídeo custei a acreditar que alguém tivesse disponibilizado-o na internet supondo que isso ajudaria a melhorar a imagem do governador.
Mas, governador, em alguma coisa eu concordo com vossa excelência. Considerando o quadro da nossa Paraíba, a universidade tem que dar respostas para os enormes desafios que a comunidade, nos seus diversos recantos, vivencia. Seguramente, ninguém discorda disso. Por essa razão, mais do que nunca ela tem que ser estadual e forte. Temos muito ainda o que avançar no que se refere ao retorno que devemos dar a comunidade quanto ao conhecimento que fomentamos e produzimos, muito o que avançar no que se refere a intersecção entre pesquisa, ensino e extensão.
Acho que começamos a fazer isso e vossa excelência não está contribuindo muito para avancemos nesse sentido. Ademais, como integrante dessa grande comunidade que é a UEPB, desconheço que vossa excelência tenha provocado algum momento para que pudéssemos avançar nesse sentido. Talvez porque eu seja, por uma pequena década, apenas e simplesmente professora da UEPB, mais precisamente lotada no Departamento de Serviço Social, vinculação institucional da qual, aliás, tenho muito orgulho, sem cargo de maior importância e sem auferir os privilégios que vossa excelência denuncia. Uma coisa eu lhe asseguro governador: a UEPB que a qual eu pertenço e me orgulho de pertencer; a UEPB que eu ajudo a construir, do modesto lugar que ocupo, é bem diferente, diametralmente eu diria, daquela que vossa excelência tem insistido em apresentar ao povo da Paraíba.
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