Nessa verdadeira guerra de informação e desinformação que se transformou o não cumprimento por parte do governo da lei de autonomia financeira da UEPB, algumas discussões suscitadas por membros do governo e por alguns jornalistas chamam a atenção.
Uma das mais interessantes, a meu ver, é a acusação de que o governo teme repassar tanto dinheiro quanto a lei lhe obriga por acreditar que tais recursos seriam investidos de maneira errada pela UEPB.
Só com a simples declaração desse pensamento, o governo já ataca frontalmente a autonomia da instituição, que neste momento é discutida em seus aspectos financeiros, mas que estes não são nada além do que o lastro de independência que garante a verdadeira autonomia, que se baseia, na verdade, na autonomia de pensamento.
Mesmo que o governo desse mais do que a lei obriga e, por isso, se achasse no direito de influir diretamente nas políticas internas da instituição, ainda assim ele estaria quebrando violentamente o princípio da autonomia.
Ou seja, não é apenas, como o governo tenta nos fazer entender, uma questão de dinheiro.
Como sempre, o governo usa o dinheiro como “argumento” para tentar se imiscuir nos assuntos internos da universidade e busca fazer dele moeda de troca para modificar uma estrutura que funciona de uma maneira que na verdade deveria lhe servir de exemplo.
Façamos aqui um exercício de criatividade para tentar vislumbrar como seria o governo se seu funcionamento fosse igual ao da UEPB.
Para começar, imagine se nas eleições estaduais cada candidato a governador, além de seu vice, fosse obrigado a apresentar, ainda no período de campanha, todo o seu primeiro escalão (secretários, presidentes de estatais, diretores de agências etc.), sem direito a modifica-los depois de eleito. Na UEPB é assim.
Imagine se além de não poder mexer em suas secretarias, o governo tivesse que conviver com uma estrutura onde todos os cargos de chefia e coordenação de seus diversos departamentos fossem escolhidos pela população, através de eleições diretas. Na UEPB é assim.
Imagine ainda que para que fosse produzida sua lei orçamentária, o governo devesse submetê-la a conselhos formados por representantes de todos os setores de sua estrutura, além da sociedade civil, que participariam de sua elaboração, sugeririam alterações, de maneira soberana a aprovariam e, além disso, fiscalizariam permanentemente sua execução, reunindo-se periodicamente para fazer as eventuais deliberações no sentido de cumpri-la ou altera-la. Na UEPB, através de seus conselhos superiores, é assim.
Imagine que o governo, ao invés de inúmeros sindicatos, alguns deles de categorias que não têm qualquer força para reivindicar seus direitos e força-lo a atendê-los, vivesse a realidade de ter todos os seus servidores em apenas duas categorias básicas, ambas com poder de efetivamente parar todas as atividades institucionais se não fossem atendidas em seus pleitos e suas demandas por condições de trabalho e remuneração digna. A UEPB vive isso.
Imagine, finalmente, que ao invés de mais de 600 mil analfabetos, além de outras centenas de milhares de incapazes de defender seus direitos, 100% (CEM POR CENTO!!!) da população paraibana tivesse o ensino médio completo e, no mínimo, estivesse cursando o ensino superior, com uma parcela significativa de especialistas, mestres, doutores, pós-doutores e cientistas das mais diversas áreas, com grau apuradíssimo de consciência social e entendimento da importância da atuação política. Na UEPB é assim.
Imaginando este cenário, fica extremamente complicado raciocinar que a UEPB fosse um feudo de um partido que, apesar de histórico, não tem grande representatividade na política nacional e que sua reitora fosse, no comando de uma quadrilha – porque se isso acontecesse, efetivamente seria uma – formada por apenas algumas dezenas de elementos, capaz de alienar e iludir milhares de pessoas com nível intelectual e cultural muito acima da média.
De fato, tal reflexão só nos faz entender porque nessa disputa a comunidade acadêmica tem se posicionado em sua absoluta maioria em favor da universidade. Além de ter poder de discernimento para verificar com seus próprios olhos o que efetivamente se passa na UEPB, tem como maior vantagem o esclarecimento necessário para entender a quem se destina de fato o discurso do governo.
Sabemos que apenas os mais ignorantes ou aqueles que de alguma maneira devem fidelidade, obediência e subserviência ao governo têm coragem para apresentar-se publicamente e defender cortes expressivos nos recursos destinados ao ensino superior e à expansão da universidade.
Mas o silêncio não basta, porque o silêncio consente.
É preciso que todos os que têm capacidade para perceber o mal que representa a atitude do governo, o precedente que está se criando e que esta situação que hoje apóia um dia pode se virar contra si saiam da passividade e entrem na discussão, utilizando dos meios que lhe sejam possíveis para repudiar o ato covarde do governador e garantir que ele entenda que a população lhe confiou um mandato, com funções e atribuições claramente definidas, e não uma procuração de plenos poderes para se insurgir contra o ordenamento legal que rege o governo que ele hoje representa.
A perversidade dessa situação é que se a população paraibana cair na conversa do governo estará privando a si própria, pela manutenção de sua ignorância, de um dia ter capacidade de reagir a este tipo de ataque à sua soberania.
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