Cansado dos rankings que colocam universidades brasileiras atrás de centros de pesquisa da China e da Índia, o presidente da Capes, Jorge Almeida Guimarães, ataca: "Há um esforço internacional de transformar a educação em comércio". Para ele, universidades de países desenvolvidos querem vender a ideia de que o melhor é exportarmos alunos. "Estão querendo que a gente mande estudantes pra lá a custos exorbitantes".
A Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) é o órgão responsável por gerir a pós-graduação no Brasil. No último ranking internacional divulgado pela organização inglesa Times Higher Education, o País ficou de fora das 200 primeiras posições. A instituição brasileira melhor colocada foi a Universidade de São Paulo (USP), no 232ª lugar e atrás de centros de pesquisa dos países BRIC - o bloco de economias emergentes integrado por Brasil, Rússia, Índia e China.
Guimarães é duro ao reconhecer que o Brasil não se encaixa em padrões internacionais.
- Esses grupos que ganham Prêmio Nobel tem 30, 40 pessoas com PhD trabalhando num único grupo. Nós não temos isso. Não vamos ter tão cedo.
Para o presidente da Capes, as universidades brasileiras só alcançarão excelência em pesquisa quando se tornarem mais inclusivas. Para isso, ele diz que a educação básica deve melhorar primeiro. "Se não tiver muito futebol de várzea, não vamos ter os Pelés", compara.
Leia a entrevista
Num ranking das cem melhores universidades do mundo, feita pela inglesa THE, nenhuma universidade brasileira apareceu, embora instituições de outros países BRIC tenham sido listadas. O senhor acredita que isso seja um sinal importante?
Jorge Almeida Guimarães - Eu acho que não. Há um esforço internacional de transformar a educação em comércio. A Europa perdeu jovens e os países ricos passaram a ver a educação como um negócio. É por isso que aparecem esses rankings. Eles estão querendo que a gente mande estudantes pra lá a custos exorbitantes. Quando a USP, nossa universidade mais antiga, foi criada, Harvard já tinha 300 anos. Como você quer que em cinquenta anos nos igualemos? Esses rankings são estranhos.
O senhor acha que faltam critérios para avaliar as nossas universidades?
Quantas universidades no mundo são melhores (em agronomia) do que Viçosa, Lavras, ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luis de Queiroz)? Isso não aparece porque isso não interessa pra eles. A quantidade de prêmios Nobel é um critério. Está cheio de país cheio de Prêmio Nobel e o país está quebrado. Nós perdemos várias chances de ganhar Prêmio Nobel: Carlos Chagas, Cesar Lattes... Na literatura, então, deus me livre! Então, esses indicadores que eles usam são intencionalmente escolhidos.
Trata-se de um aspecto cultural? Por exemplo, estudos mais voltados à realidade brasileira - como sobre doenças tropicais - não são tão valorizados?
É verdade. Um artigo do professor Flávio Grynszpan compara a nossa universidade com a de outros países do BRIC e conclui que estamos muitíssimo bem. Temos muito o que melhorar, mas nós temos quinze vezes menos doutores per capta do que a Suiça, por exemplo. Não é uma desculpa, mas é o fato de que nós temos caminhos a percorrer e não será por meio desse modelo europeu.
Este mês, a reitora de Harvard esteve no Brasil buscando alunos e professores para levar aos Estados Unidos...
Exatamente. Que país pode servir de modelo para a nossa educação? Só nós mesmos. Temos que tirar leite das pedras. Temos que melhorar a educação básica e consequentemente vamos melhorar as universidades num próximo passo. Mandar centenas de jovens para a Inglaterra, isso nós já fizemos no passado. Geramos uma elite que não está desenvolvendo o país. Houve um político que falou em colocarmos as universidades brasileiras entre as 20 maiores. Sinto muito, isso vai demorar.
O senhor falou em Prêmio Nobel, não temos pesquisas inovadoras o suficiente para receber prêmio?
Nós não fazemos ciência para Prêmio Nobel. Essa é a grande diferença. Nós estamos formando gente, estamos capacitando. Esses grupos que ganham Prêmio Nobel tem 30, 40 pessoas com PhD trabalhando num único grupo. Nós não temos isso. Não vamos ter tão cedo, falta gente para muitas áreas de estudo.
A USP chegou a reportar que aumentou o número de pessoas aprovadas no vestibular que desistiam da Universidade na primeira chamada. Como o senhor vê isso? Existe uma contraposição entre a universidade ser de elite e disputada e ser mais inclusiva? Ela perde renome?
Ciência e educação é que nem futebol. Se não tiver massa, não dá. Se não tiver muito futebol de várzea, não vamos ter os Pelés. Precisamos aumentar muito o número de pessoas nas universidades. Enquanto não atingirmos isso, não temos a expectativa de tirar dessa massa os melhores cérebros. A pós-graduação se beneficiou disso, o Brasil está entre os países em que a pós mais cresceu. Mas isso foi feito à custa de um sacrifício social muito pesado. Muitos Pelés da educação e da ciência ficaram sem ter chances na vida. Se corrigirmos os furos na educação básica, certamente vamos chegar a posições de destaque.
Mas fazer pesquisa para Nobel se opõe a investir em inclusão?
Não, de forma alguma. Tem que investir. Vai chegar uma hora em que teremos uma massa de doutores e poderemos formar grupos de trinta pessoas.
A Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) é o órgão responsável por gerir a pós-graduação no Brasil. No último ranking internacional divulgado pela organização inglesa Times Higher Education, o País ficou de fora das 200 primeiras posições. A instituição brasileira melhor colocada foi a Universidade de São Paulo (USP), no 232ª lugar e atrás de centros de pesquisa dos países BRIC - o bloco de economias emergentes integrado por Brasil, Rússia, Índia e China.
Guimarães é duro ao reconhecer que o Brasil não se encaixa em padrões internacionais.
- Esses grupos que ganham Prêmio Nobel tem 30, 40 pessoas com PhD trabalhando num único grupo. Nós não temos isso. Não vamos ter tão cedo.
Para o presidente da Capes, as universidades brasileiras só alcançarão excelência em pesquisa quando se tornarem mais inclusivas. Para isso, ele diz que a educação básica deve melhorar primeiro. "Se não tiver muito futebol de várzea, não vamos ter os Pelés", compara.
Leia a entrevista
Num ranking das cem melhores universidades do mundo, feita pela inglesa THE, nenhuma universidade brasileira apareceu, embora instituições de outros países BRIC tenham sido listadas. O senhor acredita que isso seja um sinal importante?
Jorge Almeida Guimarães - Eu acho que não. Há um esforço internacional de transformar a educação em comércio. A Europa perdeu jovens e os países ricos passaram a ver a educação como um negócio. É por isso que aparecem esses rankings. Eles estão querendo que a gente mande estudantes pra lá a custos exorbitantes. Quando a USP, nossa universidade mais antiga, foi criada, Harvard já tinha 300 anos. Como você quer que em cinquenta anos nos igualemos? Esses rankings são estranhos.
O senhor acha que faltam critérios para avaliar as nossas universidades?
Quantas universidades no mundo são melhores (em agronomia) do que Viçosa, Lavras, ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luis de Queiroz)? Isso não aparece porque isso não interessa pra eles. A quantidade de prêmios Nobel é um critério. Está cheio de país cheio de Prêmio Nobel e o país está quebrado. Nós perdemos várias chances de ganhar Prêmio Nobel: Carlos Chagas, Cesar Lattes... Na literatura, então, deus me livre! Então, esses indicadores que eles usam são intencionalmente escolhidos.
Trata-se de um aspecto cultural? Por exemplo, estudos mais voltados à realidade brasileira - como sobre doenças tropicais - não são tão valorizados?
É verdade. Um artigo do professor Flávio Grynszpan compara a nossa universidade com a de outros países do BRIC e conclui que estamos muitíssimo bem. Temos muito o que melhorar, mas nós temos quinze vezes menos doutores per capta do que a Suiça, por exemplo. Não é uma desculpa, mas é o fato de que nós temos caminhos a percorrer e não será por meio desse modelo europeu.
Este mês, a reitora de Harvard esteve no Brasil buscando alunos e professores para levar aos Estados Unidos...
Exatamente. Que país pode servir de modelo para a nossa educação? Só nós mesmos. Temos que tirar leite das pedras. Temos que melhorar a educação básica e consequentemente vamos melhorar as universidades num próximo passo. Mandar centenas de jovens para a Inglaterra, isso nós já fizemos no passado. Geramos uma elite que não está desenvolvendo o país. Houve um político que falou em colocarmos as universidades brasileiras entre as 20 maiores. Sinto muito, isso vai demorar.
O senhor falou em Prêmio Nobel, não temos pesquisas inovadoras o suficiente para receber prêmio?
Nós não fazemos ciência para Prêmio Nobel. Essa é a grande diferença. Nós estamos formando gente, estamos capacitando. Esses grupos que ganham Prêmio Nobel tem 30, 40 pessoas com PhD trabalhando num único grupo. Nós não temos isso. Não vamos ter tão cedo, falta gente para muitas áreas de estudo.
A USP chegou a reportar que aumentou o número de pessoas aprovadas no vestibular que desistiam da Universidade na primeira chamada. Como o senhor vê isso? Existe uma contraposição entre a universidade ser de elite e disputada e ser mais inclusiva? Ela perde renome?
Ciência e educação é que nem futebol. Se não tiver massa, não dá. Se não tiver muito futebol de várzea, não vamos ter os Pelés. Precisamos aumentar muito o número de pessoas nas universidades. Enquanto não atingirmos isso, não temos a expectativa de tirar dessa massa os melhores cérebros. A pós-graduação se beneficiou disso, o Brasil está entre os países em que a pós mais cresceu. Mas isso foi feito à custa de um sacrifício social muito pesado. Muitos Pelés da educação e da ciência ficaram sem ter chances na vida. Se corrigirmos os furos na educação básica, certamente vamos chegar a posições de destaque.
Mas fazer pesquisa para Nobel se opõe a investir em inclusão?
Não, de forma alguma. Tem que investir. Vai chegar uma hora em que teremos uma massa de doutores e poderemos formar grupos de trinta pessoas.
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