segunda-feira, 28 de março de 2011

Morre José Comblin, da Teologia da Libertação

Do Estadão

Morreu no último domingo (28), em Salvador, o padre belga José Comblin, 88 anos, um dos mais importantes e polêmicos teóricos da Teologia da Libertação, e autor de vários livros, entre os quais A Teologia da Enxada, sobre a vivência cristã e teológica nas comunidades rurais.

Padre Comblin estava em tratamento médico na capital baiana. Foi encontrado morto, sentado, em seu quarto, quando era esperado para a oração da manhã e não apareceu na capela. Ele tinha problemas cardíacos e usava marcapasso. Apesar da doença, parecia bem disposto e estava trabalhando.

Nascido em Bruxelas, em 22 de março de 1923, padre Comblin veio para o Brasil em 1958, atendendo a apelo do papa Pio XII, que no documento Fidei donum (O Dom da Fé) pedia missionários voluntários para regiões com falta de sacerdotes.

Depois de trabalhar em Campinas e, em seguida, passar uma temporada no Chile, foi para Pernambuco, em 1964, quando d. Helder Câmara foi nomeado arcebispo de Olinda e Recife. Perseguido pelo regime militar, foi detido e deportado, em 1972, ao desembarcar no aeroporto de volta de uma viagem à Europa.

José Comblin: Perfil biográfico
José Comblin era o mais velho de 3 irmãos e 2 irmãs. Seus pais Alice e Firmino criaram os 5 filhos com os tradicionais valores da religião, da austeridade da época e valorizando sempre o trabalho.

Frequentou o curso primário na escola paroquial e fez o curso secundário no Colégio São Pedro. Em 1940, entrou no Seminário Leão XIII, em Lovaina (Bélgica). Fez estudos de Ciências Biológicas e Filosofia de 1940 a 1942. Ingressou no Seminário São José em Malinas (Bélgica), em 1943 e fez o 1º ano de Teologia. Em 1944, entrou no Seminário Maior de Malinas e cursou o 2° e o 3° ano de Teologia.

De 1946 a 1950, cursou a Faculdade de Teologia em Lovaina, tornando-se Doutor na área. Sua ordenação sacerdotal se deu em 9 de fevereiro de 1947, em Malinas. Como sacerdote, exerceu a função de vigário cooperador na paróquia Sagrado Coração de Jesus, em Bruxelas, de 1950 a 1958. Além disso, foi professor de teologia no CIBI (Centro de Formação para Seminaristas em Serviço Militar), Bélgica, durante o ano de 1951.

Impulsionado pelos apelos missionários para países da África e da América Latina, solicitou ao seu cardeal, ser enviado para a América Latina. Atendendo à solicitação do Bispo de Campinas que desejava sacerdotes doutores para contribuir na formação de seu clero, foi enviado para o Brasil, onde chegou em 30 de junho de 1958. De 1958 a 1962, em Campinas (SP), foi professor no seminário diocesano e na Universidade Católica de Campinas. Além disso, foi convidado para ser assistente diocesano da JOC (Juventude Operária Católica). Em 1959 foi professor no Studium Theologicum dos Dominicanos em São Paulo.

Novos apelos levaram o padre José Comblin ao Chile. De 1962 a 1965 foi professor na Faculdade de Teologia da Universidade Católica de Santiago (Chile). Também o Brasil vivia sob a ditadura militar, mas no Nordeste florescia uma Igreja comprometida com o mundo dos pobres e Comblin ouviu o chamado de  Dom Hélder Câmara e foi estabelecer-se em Pernambuco.

De 1965 a 1968 foi professor no Seminário regional do Nordeste em Camaragibe e professor no Instituto de Teologia do Recife. No início dos anos 70 passou a orientar uma experiência de formação de seminaristas que buscavam um estudo mais comprometido com a realidade e adequado ao exercício do ministério no mundo rural. José Comblin criou, então, um modo de estudo que depois ficou conhecido como Teologia da Enxada.

Ao mesmo tempo foi convidado a dar aulas no Equador e assim, de 1968 a 1972, foi professor de Teologia no IPLA (Quito, Equador). Passou a dar assessoria a diocese de Riobamba, cujo bispo, Dom Leônidas Proaño foi um símbolo do compromisso com a causa indígena no Equador. Até 1985 passava duas quinzenas por ano em Riobamba e continuou frequentando a diocese até a morte de Dom Leônidas Proaño, em 1988.

Passou, ainda, a lecionar Teologia Pastoral na Faculdade de Teologia da Universidade Católica de Lovaina (depois, Louvain-la –Neuve), cargo que exerceu de 1971 a 1988. José Comblin estava fortemente inserido na Igreja de Dom Hélder que marcava o cenário nordestino e nacional pelo seu compromisso com as causas populares. Dava assessoria a Dom Hélder na elaboração de posicionamentos, documentos e intervenções. A Igreja de Recife e Olinda era uma grande esperança para os pobres. Considerado subversivo e ameaçador ao sistema, José Comblin foi expulso do Brasil em 24 de março de 1972.

Decidiu, então, retornar ao Chile, onde já tinha atuado por 4 anos e contava com um círculo de amigos. Assim, estabeleceu-se em Talca onde residiu de 1972 a 1980. No entanto, pouco tempo depois, em 1973, ocorreu o golpe militar no Chile com a deposição e o assassinato de Allende. Diante disso, deixou o ensino para evitar chamar a atenção. Dava suas contribuições intelectuais inclusive ao Vicariato da Solidariedad de Santiago, única instituição que enfrentou o ditador Pinochet na questão das torturas e dos desaparecimentos durante o regime militar.

Para o Vicariato da Solidariedad, José Comblin escreveu o seu estudo sobre a Ideologia da Segurança Nacional, a doutrina dos ditadores militares da América Latina. Durante o tempo que permaneceu no Chile, suas contribuições foram muitas.

A Fundação do Seminário Rural, em 1979, em Alto de Las Cruces, Talca, uma experiência de formação ao sacerdócio de jovens do meio rural respeitando a sua cultura camponesa, foi uma delas. Outra colaboração foi o curso de formação para professores de religião: fundamentos bíblicos e teológicos para uma clientela de professores e lideranças populares. Em 1980, ocorreu a sua expulsão do Chile. Conseguiu retornar ao Brasil, com visto de turista que exigia renovação a cada 3 meses, o que o obrigava a sair do país a cada 3 meses durante 6 anos, para renovar o visto. Finalmente, em 1986 foi anistiado e recebeu novamente o visto permanente.

Com o grupo da Teologia da Enxada e o apoio do Arcebispo Dom José Maria Pires, de João Pessoa, fundou, em 1981 no Avarzeado, PB, o Seminário Rural. Posteriormente denominado Centro de Formação Missionária, a experiência estabeleceu-se em Serra Redonda. Teve o objetivo de formar sacerdotes e missionários populares para a evangelização da população rural, com uma metodologia adequada e levando em consideração e cultura camponesa.

A partir de então, passou a dedicar-se prioritariamente à formação de lideranças populares. Em 1981 foi professor no Seminário Rural do Avarzeado (Pilões, PB), depois em Serra Redonda (PB), depois Centro de Formação Missionária. Em 1987 participou da fundação das Missionárias do Meio Popular, com o mesmo objetivo. Neste ano surgiu também o Programa da Árvore – formação de Animadores de CEBs na Arquidiocese da Paraíba com sua orientação.

Em 1989 fundou o Instituto de Formação Pastoral de Juazeiro (PB) com núcleos em Mogeiro (PB) e em Miracema (Tocantins).

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