Festejos - Trio de representantes da União Europeia (no centro) comemora o fim da conferência, com um acordo entre os países em desenvolvimento e os ricos
Crédito da Foto: Yurijo Nakao/Reuters
Por Ricardo Mioto do Caderno Ciência, da Folha de São Paulo
Representantes de quase 200 países chegaram a um acordo no último dia 30 de outubro, em Nagoya (Japão), e assinaram um tratado sobre a biodiversidade.
As nações concordaram em reconhecer o direito dos países sobre a sua biodiversidade. Isso significa que países que desejarem explorar a diversidade natural (como plantas, animais ou micro-organismos) em territórios que não sejam seus terão de pedir autorização para as nações donas dos recursos.
Se estudo da fauna e da flora alheia resultar em novos produtos, como fármacos ou cosméticos, os lucros terão de ser repartidos entre quem os desenvolveu e o país de origem do recurso, conforme contrato prévio.
Se houver comunidades que utilizem os recursos genéticos tradicionalmente, como tribos indígenas, elas também terão direito de receber royalties pela exploração comercial da biodiversidade.
Os diplomatas chamam esses pontos de ABS, uma sigla em inglês para "acesso e repartição de benefícios".
VITÓRIA BRASILEIRA
As negociações para estabelecer esses pontos sobre o acesso aos recursos genéticos levaram quase 20 anos. Desde a Eco-92, no Rio de Janeiro, temas ligados à biopirataria são discutidos, e os países ricos relutavam em assinar um pacto que garantisse a soberania dos países sobre a sua biodiversidade.
Por isso, o acordo realizado agora, na COP-10 (10ª Conferência das Partes da Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica), em Nagoya, foi visto como uma grande vitória brasileira, país dono da maior biodiversidade do mundo e protagonista nas negociações no Japão.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, chefe da delegação brasileira, disse estar satisfeita.
"É realmente uma vitória. Estou certa que temos um novo arranjo para a conservação biológica. Para nós é bom, finalmente avançamos, mas não é excelente."
Ela diz isso porque algumas posições brasileiras, como o efeito retroativo para direitos sobre a biodiversidade (haveria royalties por substâncias já desenvolvidas e comercializadas, por exemplo), não estão no acordo.
A ministra defendeu, porém, que algum acordo é melhor do que nenhum acordo. "É necessário entender que precisamos de conciliação, senão não há resultados."
Ela diz que o sucesso de Nagoya, com um consenso entre centenas de países, pode servir de exemplo para as negociações do clima, que seguem em Cancún, em dezembro. "Sou uma mulher pragmática e otimista."
Não foi só Teixeira que saiu de Nagoya sorrindo. O clima entre os representantes de todos os países era de comemoração pelo acordo, que parecia distante conforme as negociações avançavam pela madrugada de sexta para sábado no Japão.
"Não é só um protocolo chato. Ele se refere a bilhões de dólares da indústria farmacêutica", disse Tove Ryding, do Greenpeace.
"Se Kyoto entrou para história como o lugar onde o acordo do clima nasceu, em 1997, Nagoya terá destino similar", diz Ahmed Djoghlaf, secretário-executivo da Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica (CBD), responsável pela conferência.
Além do protocolo sobre a biodiversidade, várias metas de aumento na quantidade de terras e áreas marítimas preservadas foram estabelecidas.
A única ausência notável foi a dos Estados Unidos, que nunca participaram da CBD.
PRINCIPAIS PONTOS DO
PROTOCOLO DE NAGOYA
- Os países são soberanos sobre a sua biodiversidade e recursos genéticos (incluindo plantas, animais e micro-organismos). Nenhuma outra nação pode acessar e explorar isso sem autorização do "dono" do recurso natural
- Caso algum país crie, com recursos naturais de outro, novos produtos (como remédios), ambos devem ser "sócios" e dividir os lucros oriundos de eventual comercialização
- Esses lucros devem ser divididos, também, com as comunidades que usam o recurso tradicionalmente caso uma multinacional desenvolva um cosmético a partir de uma planta que uma tribo indígena utilize, pagará royalties a ela
- 10% das áreas marinhas e costeiras vão virar regiões protegidas até 2020. Hoje, 1% está sob preservação
- Também até 2020, 17% das áreas terrestres devem estar protegidas. Hoje, esse valor é de 12%
- Resta, porém, um ponto de discórdia sobre os royalties de recursos naturais: países em desenvolvimento querem que eles existam inclusive para substâncias já desenvolvidas, mas os países ricos não aceitam royalties retroativos
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